O Douro não é só boa terra para uvas, amêndoas, tomate, laranjas e sabe-se lá o que mais. É também um terroir com identidade vincada no azeite. Só falta reconhecer essa qualidade e perceber que os preços dos azeites do Douro não podem ser comparados com produtos de outras regiões.
Ao fim de três anos de estudo, a equipa formada pela Associação dos Produtores em Proteção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro (APITAD), pelo Instituto Politécnico de Bragança (IPB) e pelo Centro de Estudos e Promoção do Azeite do Douro (CEPAD) irá em breve apresentar ao Ministério da Agricultura o caderno de especificações para desencadear o reconhecimento de uma Indicação Geográfica Protegida (IGP) para o azeite do Douro, que, como é necessário nestas matérias, terá de ser avaliada em Bruxelas. Se tudo correr bem, a IGP Douro nascerá lá para 2024. Haja fé.
Durante estes três anos, Francisco Pavão (APITAD), Nuno Rodrigues e José Alberto Pereira (IPB) percorreram o Douro de lés-a-lés à procura de 100 amostras de azeite por cada ano. Estas amostras foram submetidas a avaliações sensoriais e a avaliações químicas, no sentido de se perceber se existe ou não um perfil de azeite do Douro. E, sendo o caso, definir esse mesmo perfil.
Se o Douro é um terroir único para a produção de uva, de amêndoa, de tomate e até de laranja, é evidente que será também para a produção de azeite. De resto, não existe apenas um perfil de azeite do Douro, assim como não existe um único perfil de vinho do Douro.
Pode dizer-se, de forma genérica, que os azeites do Douro, por comparação com os azeites de outras regiões portuguesas, têm uma complexidade aromática acentuada porque misturam notas de frutos secos, especiarias doces, ervas aromáticas, casca de amêndoas verdes e banana, ora verde, ora madura. Tudo isso com intensidade média. Na boca sente-se alguma doçura, sendo que os amargos e os picantes são moderados, embora persistentes.
A complexidade e a identidade dos azeites do Douro é tal que, em prova cega, provadores treinados conseguem identificar um azeite do Douro numa série com azeites gregos ou espanhóis. E é esta riqueza que, julgamos, merece ser reconhecida. Para bem dos produtores e do Douro e para alegria dos consumidores.
Claro que uma coisa é um azeite de Baião (mais suave na boca) e outra é um azeite de Freixo de Espada à Cinta (com notas mais amargas e picantes), mas esta é a riqueza de uma região cujos azeites têm de ser apreciados com criatividade à mesa e compreendidos no que se refere à sua estrutura de custos.
Esta última questão daria para encher uma tese académica, mas vamos deixar aqui dois dados. Um, o custo de produção por litro de azeite no Douro varia entre 8 e 12€ (nada disto inclui garrafa, rótulo e logística). Dois, enquanto este ano se está a pagar azeitona a 0,45€ por quilo em Trás-os-Montes, no Douro, 0,45€ é somente o custo de apanha de um quilo de azeitona. Donde, como é evidente, um azeite do Douro não pode nem deve ser barato.
Pintas
“O Douro também é bonito por causa do olival”
Se levassem a sério as regras da contabilidade, Sandra Tavares da Silva e Jorge Serôdio Borges limitar-se-iam a cuidar das oliveiras de bordadura como ornamento das vinhas no Vale de Mendiz, mas, nas palavras da enóloga, “o olival e o azeite são uma paixão”. “Paixão enquanto produto em si, enquanto elemento da biodiversidade e enquanto elemento estético. O Douro não é bonito só por causa das vinhas. O Douro também é bonito por causa do olival.”
De facto, é preciso ter uma boa dose de paixão para se enviar, todos os dias, em caixas perfuradas, azeitonas do Pinhão para Almendra, onde está o lagar da Carm, que extrai o azeite […]