Francisco Castro Rego, que presidiu ao Observatório Técnico Independente (OTI), diz que o que se seguiu a Pedrógão foram “experiências interessantes” no território e não a transformação necessária.
Depois de um evento trágico na floresta portuguesa, a prática comum é avançar com pacotes de medidas. Francisco Castro Rego, que presidiu ao Observatório Técnico Independente (OTI), entidade criada para peneirar as novas políticas de prevenção e combate a incêndios a seguir aos grandes eventos de 2017, defende que a floresta precisa de estabilidade nas políticas e lamenta que o balanço pós-incêndios de 2003 e 2005 não tenha sido aproveitado. O professor do Instituto Superior de Agronomia considera também que o trabalho do observatório, que funcionou entre 2018 e 2021, continuaria a ser útil, mesmo que noutros moldes e mesmo que com outras pessoas.
Nos últimos quatro anos houve menos ignições e menos área ardida que a média da década. Este é um resultado do que foi feito nos últimos anos ou é conjuntural?
Na análise dos dados, é sempre importante perceber qual a componente da meteorologia e qual é a componente do comportamento humano. No OTI tentámos sempre destrinçar as duas coisas, utilizando classes de perigo de incêndio para comparar situações que são comparáveis. Há uma variabilidade muito grande entre anos. De qualquer forma, mesmo tirando o efeito da meteorologia, o número de ignições tem diminuído. Essa tendência já começou a partir dos incêndios de 2003 e 2005. As campanhas de sensibilização também têm aqui um papel. Nesse sentido, estamos no bom caminho, sobretudo reduzindo as ignições nos períodos em que o perigo é maior. As pessoas ainda têm presentes as imagens [dos incêndios de 2017] e isso tem efeitos no comportamento. Mas a memória tem os seus limites.
Nos últimos cinco anos, o país melhorou as políticas de prevenção e combate?
Julgo que sim. Há um melhor uso de tecnologias. No OTI registámos com apreço que os grupos de intervenção mais activa da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC) têm tido um apoio tecnológico muito bom, com informação via satélite, mais informação do terreno e mais modelos de propagação para lidar com incêndios de maior gravidade. Mas esses grupos precisam de ser reforçados com mais pessoal e mais equipamento.
E na prevenção?
No OTI também fomos bastante críticos em relação a um aspecto que não me parece ainda ter solução: ter um enquadramento nacional e regional adequado às políticas que se vão fazendo. Tem sido muito interessante a experiência das acções integradas de gestão da paisagem, mas cobre apenas algumas áreas e não há propriamente uma métrica muito bem explicitada.
Supostamente, começam em áreas de maior risco de incêndio.
Supostamente. Mas, acima desse nível, foram estabelecidos os Planos Regionais de Ordenamento Florestal, que tinham as suas metas, mas nunca foram revistos tendo em conta o aumento do perigo de incêndio. Não haveria razão nenhuma para que, entre 2017 e 2022, não tivesse havido essa alteração. Digo o mesmo sobre a Estratégia Nacional para as Florestas. Deveria ter havido, nestes grandes documentos de enquadramento da política florestal, uma revisão das metas tanto a nível nacional como regional, que integrasse a preocupação maior com o risco de incêndio. Não havendo esta correcção, estes programas mais localizados, que têm a ver com a gestão da paisagem aqui e acolá, não têm depois uma métrica que lhes possa ser associada. Não há indicação se naquela região ou naquele município a área de espécies como o eucalipto ou o pinheiro […]