O triste “fado” do Produtor de Leite português – Manuela Dias

Ser produtor de leite é ter um estilo de vida completamente diferente de qualquer cidadão comum. É trabalhar 80 horas por semana, de 2ª a domingo, 365 dias por ano. É ter um custo de produção de 0,37€/litro de leite e vender o mesmo leite a 0,33€ e, mesmo assim, continuar a levantar todos os dias às 6h00 da manhã, faça sol, chuva ou frio e lutar, lutar… e resistir a este estilo de vida!

Mas ser-se produtor de leite português não é o mesmo que ser produtor de leite no centro e norte da Europa. Os produtores de leite do centro e norte da Europa têm condições agronómicas, climáticas, políticas, económicas e financeiras mais vantajosas que as nacionais, que lhes permitem ter um custo de produção substancialmente mais baixo que o português. Têm também um preço por litro de leite entre 2 a 3 cêntimos, em média, acima do praticado a nível nacional.

Estas melhores condições de produção, dos nossos colegas produtores do norte e centro europeu, traduzem-se num aumento de produção, com o consequente aparecimento dos excedentes que são canalizados para países onde o nível de vida dos consumidores está em franca expansão, como é o caso da China e da Índia.

Em Portugal passa-se exactamente o oposto. A produção de leite está em queda, ano após ano. Os produtores nacionais estão apenas virados para o mercado interno. Mercado este que não precisa de palavras para o caracterizar, nos tempos que correm, bem como, presumo, nos próximos 5 anos. Mas, como se isso não bastasse, ainda caí sobre nós, produtores de leite, a guerra feroz, incompreensível, antipatriótica, esmagadora de margens, trituradora da produção nacional,…entre a Indústria e a grande Distribuição Nacional.

Não se pode em “nome da crise” continuar com esta guerra que vem “chacinando” centenas de produtores todos os anos. E, não se iludam as “mentes iluminadas” que vêm dizendo que os produtores que acabam são os mais pequenos, com menor capacidade para se modernizarem e de se adaptarem às novas exigências. Não!! Os produtores de leite que realmente estão com grandes dificuldades são os que têm explorações modernas, bem dimensionadas, que investiram o que tinham e não tinham para ganharem dimensão empresarial e competitividade.

Também é importante lembrar que quando uma exploração leiteira “fecha portas” muito dificilmente voltará a produzir leite, tendo em conta o grande valor do investimento inicial, sobretudo em animais, para voltar a produzir.
Perante tudo isto, eu, como produtora de leite, cada vez estou mais convicta de que todo este esforço diário do produtor de leite português, nas actuais circunstâncias, é um esforço “inglório”!

Será este o nosso triste FADO?

Seria bom começar o novo ano de 2012 com mais esperança para a produção de leite nacional e não dar ouvidos aos fantasmas que falam em nova descida para os primeiros meses do ano. Será a machadada final na produção? Porque o que realmente está em causa, para além da falência das explorações, é a soberania nacional para a produção de leite. Ou será que estamos dispostos num futuro próximo dar aos nossos filhos ( e eu tenho 3) “os restos ou sobras” dos outros países?…

Manuela Dias Pimenta
Produtora de leite
Licenciada em Engenharia Agro-Pecuária

Socorro!!! – Manuela Dias


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