Olival Tradicional de Trás-os-Montes e Alto Douro. Um futuro a preservar – Francisco Pavão

Este foi um ano completamente atípico para a agricultura e para a olivicultura em particular, com ausência de frio motivando baixa diferenciação floral e temperaturas muito altas em períodos críticos e chuva quase constante no período da floração. As consequências foram taxas de vingamento baixas e um atraso do ciclo vegetativo em cerca de 15 dias, o que provoca que à data os teores de gordura sejam 1 a 2% mais baixos que em período homólogo da safra 2015/2016. Em Trás-os-Montes espera-se uma produção inferior à média, com quebras na ordem dos 15 a 20%, sendo que na região do Douro a quebra será ainda maior, com valores na ordem dos 40 – 50%.

Na região de Trás-os-Montes e Alto Douro predomina o olival tradicional de sequeiro e, mesmo grande parte das novas plantações efectuadas a partir de 1986, são também conduzidas em regime de sequeiro, o que provoca fortes constrangimentos na produção sobretudo pela falta de água em períodos críticos do ciclo cultural da oliveira, nomeadamente período que decorre de Maio a Setembro.

No panorama olivícola nacional esta região representa cada vez menos da produção nacional, apesar de ser ainda a segunda região produtora, fruto sobretudo da “revolução” ocorrida no Alentejo com a instalação do regadio do Alqueva, potenciando que nos últimos anos tenham vindo a ser plantados centenas de hectares de olival de regadio. A investigação nacional pouco ou nada fez na preservação/melhoramento das nossas cultivares, pelo que a quase totalidade destas novas plantações foi efectuada com o recurso a cultivares estrangeiras.

O olival transmontano encontra-se assim ameaçado relativamente à sua sustentabilidade técnico-económica, apresentando custos de produção elevados, sobretudo no que concerne à forte limitação de mecanização que pode sofrer, mas também à dispersão e área das parcelas, para além de apresentar produtividades baixas associadas ao regime de sequeiro e a fenómenos de safra e contra-safra mais ou menos acentuados.

Este tipo de olival tradicional para além da sua função produtiva, apresenta também algumas características que deverão ser consideradas como essenciais para a sua manutenção e apoio, nomeadamente pela diminuição do efeito poluente da agricultura (grande parte deste olival é conduzido com muitos poucos inputs externos à exploração, nomeadamente com o uso reduzido dos fertilizantes e produtos fitofarmacêuticos), extensificação e/ou manutenção dos sistemas agrícolas tradicionais extensivos (este tipo de olivais é conduzido na sua quase totalidade em regime extensivo de sequeiro, segundo práticas tradicionais de agricultura, contribuindo para a manutenção do “mosaico” agrícola na paisagem portuguesa, caracterizada pela sua heterogeneidade de culturas agrícolas praticadas), conservação dos recursos e da paisagem rural (estes olivais são sobretudo caracterizados por apresentarem cultivares tradicionais com um enorme potencial genético que urge preservar/potenciar) e são ainda uma característica intrínseca da paisagem rural portuguesa.

Apesar de todos os constrangimentos técnico-económicos, a região de Trás-os-Montes teima em resistir ao abandono dos olivais. Nos últimos 15 anos assistiu-se a uma alteração completa do paradigma do azeite produzido na região, associado a dois factores fundamentais, o primeiro teve a ver com a renovação tecnológica e ambiental dos lagares de azeite, hoje em dia praticamente todos a laborar em sistema de extracção contínuo a duas fases, mas a segundo e de facto o mais importante, foi a antecipação da colheita em mais de um mês daquilo que era habitual, isto é, nos últimos anos é usual a safra iniciar-se em finais de Outubro, quando era habitual iniciar-se na segunda quinzena de Dezembro. É de realçar o papel que a Associação de Olivicultores de Trás-os-Montes e Alto Douro, da Associação de Produtores em Protecção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro, juntamente com a Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Bragança, com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e com a Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Norte, tiverem na divulgação e promoção do uso de novas técnicas e conceitos associados à “nova” olivicultura e ao azeite de qualidade.

Hoje em dia, Trás-os-Montes e Alto Douro é considerada a nível mundial como uma região produtora de azeites de excelência, assentes em três princípios basilares, cultivares autóctones, distintos terroirs e qualidade. Ano após ano, diferentes produtores da região têm vindo a ganhar prémios nos mais diversos Concursos de Azeite nacionais e mundiais.

A região tem uma Denominação de Origem Protegida, o “Azeite de Trás-os-Montes” que não abrange toda a área produtiva, e hoje em dia estão a encetar-se os primeiros passos para a criação de uma nova DOP o “Azeite do Douro”.

O factor principal da valorização de um produto, passa sobretudo pela sua mais valia comercial, isto é, potenciar a sua excelência, garantindo a viabilidade e a continuidade da cultura da oliveira na região. Neste caso, é necessário concertar estratégias de valorização que passem não só pela promoção da excelência das suas qualidades, efectuada unicamente pelos agentes da fileira, mas sim pela ligação a outros produtos com qualidade certificada produzidos na região, mas também pela promoção da identidade deste território singular, da sua gastronomia e das suas gentes, numa tentativa de criação de uma verdadeira “marca chapéu” transmontana.

 

Mirandela, 19 de Novembro de 2016

 

Francisco Pavão

Presidente da Direcção da APPITAD – Associação de Produtores em Protecção Integrada de Trás-os-Montes e Alto Douro


Publicado

em

,

por

Etiquetas: