Portugal é um pequeno país europeu, mediterrâneo por localização e cultura, mas também atlântico por posição geográfica, tradição histórica e influência da sua componente insular (Madeira e Açores).
As áreas rurais do país representam mais de 80 % do território e nelas vive mais de um terço da população. Encerram um grande e diversificado potencial de recursos naturais, humanos e culturais, mas são também afectadas por importantes insuficiências em termos de desenvolvimento económico e social e de acesso às condições de suporte à vida das pessoas e à actividade das empresas. Tal como nas outras regiões do sul mediterrâneo e ibérico, em Portugal os contrastes de desenvolvimento entre as áreas urbanas e as áreas rurais são acentuados, em desfavor destas últimas.
Região de Entre Douro e Vouga – agricultura de subsistência e explorações pecuárias isoladas e que abraça o solar da raça arouquesa
Pelas razões objectivas assinaladas, mas também por opção, as políticas de desenvolvimento rural têm vindo a ocupar em Portugal um lugar reforçado na luta por uma sociedade territorialmente mais equilibrada e saudável.
Uma plataforma de objectivos e princípios de actuação para promover o desenvolvimento rural no quadro da União Europeia tem vindo a ser amadurecida desde 1988, foi explicitamente consagrada na declaração de Cork em final de 1996, estando o desenvolvimento rural, actualmente consagrado como segundo pilar da PAC.
Os objectivos centrais a prosseguir parecem ser claros: contribuir para o desenvolvimento de uma agricultura europeia multifuncional, sustentável e repartida por todos os espaços da União, e para a diversificação económica e social dos territórios rurais europeus. A qualidade de vida das pessoas residentes nestes territórios e a sua participação nos processos de desenvolvimento constituirão os indicadores chave para avaliar o sucesso desta estratégia.
Do lado da agricultura e da política agrícola a evolução deverá conter um leque mais amplo de objectivos que contemple uma visão mais alargada gestão do espaço rural.
Do lado da diversificação e dinamização económica e social do território rural haverá que valorizar outras actividades em meio rural e as relações de interdependência com a agricultura. As iniciativas de turismo em espaço rural representam, entre muitos outros, um dos campos onde essa interdependência pode e deve ser reforçada.
O desenvolvimento rural é uma missão da sociedade e não uma tarefa que o Estado deva assegurar isoladamente. Em muitos casos a intervenção da Administração Pública será sobretudo a de disponibilizar recursos e de estimular iniciativas por parte da sociedade civil. Assim acontece com o programa LEADER que iremos abordar agora.
Quando surgiu a Iniciativa Comunitária LEADER, em 1991, não existiam em Portugal muitas Associações de Desenvolvimento, ou outras estruturas, susceptíveis de gerir o programa a nível local.
O Ministério da Agricultura, que assumiu a gestão global do programa, procedeu então a uma ampla campanha de divulgação e dinamizou todo um processo espontâneo de constituição de Associações, com vários tipos de génese mas envolvendo, sempre a constituição de parcerias entre diferentes agentes como as autarquias, Associações profissionais ou recreativas e outros agentes de desenvolvimento, formando-se diversas Associações de Desenvolvimento Local que, conjuntamente com outras, poucas, já existentes se vieram a candidatar ao programa LEADER I.
Foram definidas 20 Zonas de Intervenção em várias áreas rurais do país, incluindo a Região Autónoma da Madeira e foram credenciadas outras tantas Entidades Locais que constituíram os seus Grupos de Acção Local (GAL), elaboraram Planos de Acção Local e viram as suas candidaturas aprovadas pela Comissão Europeia.
Na gestão do programa foi muito respeitada a independência dos Grupos de Acção Local quer na divulgação e dinamização local do Programa quer na apreciação e aprovação dos projectos apresentados pelos diversos promotores, de acordo com os respectivos regulamentos internos e Planos de Acção Local, tendo a administração um papel de intermediário entre a Comissão Europeia e as Entidades Locais, e ainda um papel coordenador e fiscalizador de todo o processo financeiro, de acompanhamento dos GAL na execução do Programa e de informação e de troca de experiências.
O programa LEADER I decorreu com um sucesso notável de que poderemos salientar os seguintes aspectos:
Foi um programa inovador que veio inspirar uma nova abordagem ao desenvolvimento rural, estimulando o aparecimento de muitas outras Associações de Desenvolvimento Local com acções interessantes no meio rural.
A sua filosofia bottom up permitiu o apoio a muitas iniciativas localmente importantes que não teriam apoio na ausência do Programa.
Era um programa financeiramente ágil e eficiente.
Desenvolveu muito a oferta de turismo rural que era quase inexistente até ao momento.
Fomentou o aparecimento local de novas competências na preparação e análise de projectos.
Foi gerador de emprego no meio rural.
A sua característica de abertura permitiu o apoio a iniciativas muito diversificadas e inovadoras.
Este sucesso foi alcançado, não obstante algumas dificuldades das quais saliento as mais significativas:
As iniciativas mais inovadoras confrontaram-se muitas vezes com dificuldades resultantes da aplicação da legislação, que muitas vezes inibia o desenvolvimento, com exigências burocráticas muito pesadas ou mesmo com o impedimento de muitas iniciativas por dificuldades de licenciamentos ou outros requisitos legais. Esta questão colocou-se muito no domínio do turismo rural e no das unidades de transformação de produtos alimentares tradicionais de qualidade.
De qualquer forma, o programa teve uma taxa de execução muito próxima dos 100 % e pode-se considerar, em termos gerais, como um sucesso muito significativo.
Foi neste contexto que surgiu e foi implementada a Iniciativa comunitária LEADER II, lançada para o período de 1994 a 1999.
Surgiu, todavia, num contexto já muito diferente do descrito: o conhecimento do sucesso do programa era já grande no meio rural, a expectativa era muito significativa e, no terreno, existiam já competências técnicas e diversas Associações de Desenvolvimento candidatas à execução local do Programa por vezes no mesmo território.
O processo inicial foi, assim, lento e difícil, chegando-se, todavia a um consenso em todos os casos.
Todas as Entidades Locais do LEADER I, foram reconduzidas, com excepção de uma. Para além destas, foram credenciadas 28 novas Entidades Locais para novas áreas de intervenção, obtendo-se um total de 48 Entidades Locais, com uma cobertura generalizada das áreas rurais de Portugal incluindo as Regiões Autonomas da Madeira e dos Açores.
As formas de parceria encontradas para a formação das Entidades locais mantiveram-se diversas.
De maneira geral, face ao sucesso do LEADER I, seguiu-se o modelo genérico já adoptado, introduzindo-se apenas pequenas alterações que a experiência indicava como aconselháveis.
Foram assim reunidas as condições para que, de forma mais alargada o programa LEADER II continuasse a ampliar o sucesso já obtido e prosseguisse o seu papel específico no apoio ao desenvolvimento rural.
E assim aconteceu:
O interesse das populações rurais intensificou-se com a divulgação do Programa;
alguns aspectos agilizaram-se, pelo reforço das competências criadas a nível local;
a legislação nacional e os procedimentos enquadradores adaptaram-se, em muitos casos, às necessidades do desenvolvimento rural;
a experiência colhida permitiu focar e orientar as acções nos tipos de experiência de maior impacto ou complementares de acções já lançadas;
para além do emprego gerado directa e indirectamente pelo programa, assistiu-se a um crescimento de iniciativas, que ainda que não fossem apoiadas pelo programa, nasceram na sequência de projectos inovadores introduzidos pelo LEADER, criando-se assim novos postos de trabalho induzidos.
Por todos estes aspectos podemos, com segurança, afirmar que a experiência LEADER atingiu e de certa forma superou os seus objectivos, tornando-se uma referência necessária na definição de toda a estratégia de desenvolvimento para o meio rural.
Nuno Jordão
Presidente da Comissão Nacional de Gestão do Programa LEADER II