pesticidas

Os resíduos de pesticidas e a publicidade

Estávamos em Almeria, Espanha, em 1998, num congresso sobre resíduos de pesticidas. O representante de uma cadeia de supermercados de um país da União Europeia tinha acabado a sua apresentação, versando um grupo de produtos agrícolas comercializado por essa cadeia, de classe alegadamente superior, em que era garantido que o teor de resíduos de pesticidas era de, no máximo, metade do limite máximo de resíduo (LMR) estabelecido. Após a formalidade dos aplausos, na fase das perguntas e respostas, alguém perguntou: “E como fazem quando o limite máximo de resíduos está fixado ao nível do Limite de Determinação Analítica?” Uma onda de gargalhadas percorreu toda a sala, que contava com uma plateia de cerca de 400 participantes.

A razão da reação residia no facto do Limite de Determinação Analítica – LDA (ou Limite de Quantificação – LQ) [1] ser a concentração mais baixa em que um resultado pode ser reportado com uma margem aceitável de certeza, tipicamente de 30%. Quer isto dizer que uma amostra com 0,01 mg/kg acaba por dar origem a resultados entre 0,007 mg/kg e 0,013 mg/kg. Neste limiar, por definição, não é possível ser-se mais preciso e 30% dos resultados de amostras nesta situação vão ser falsos negativos.

Quando alguém afirma que o teor máximo de resíduos nos seus produtos é de 1/3 do LMR, está a afirmar que, no caso de LMR estabelecidos ao nível do Limite de Determinação Analítica, os seus resultados são obtidos na zona do limite de deteção do método onde a variabilidade é, por definição, de 99,9 %, considerando uma distribuição normal com um P=0,01. Uma amostra com 0,0033 mg/kg irá proporcionar resultados entre 0,000 e 0,007 mg/kg. A taxa de falsos negativos será de 50 %.

No limite, um produto publicitado como possuindo um teor de 1/3 do LMR pode proporcionar resultados iguais àqueles para os quais não foi efetuado qualquer tipo de publicidade.

Se considerarmos ainda que qualquer resultado é afetado por uma incerteza expandida típica de 50% [1], o resultado pode até ser superior.

Passados mais de 20 anos, o assunto permanece atual. Os consumidores devem estar preparados para avaliar este tipo de publicidade que, utilizando termos científico-legais de uma forma pouco correta, tentam promover uma falsa imagem de segurança dos produtos.

Artigo publicado originalmente em DICAs.


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