O adjunto de comando dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Sérgio Lourenço, descreveu hoje, no julgamento para apurar eventuais responsabilidades criminais nos incêndios de junho de 2017 neste concelho, que a dimensão destes “era monstruosa”.
“A dimensão era monstruosa”, afirmou Sérgio Lourenço, no Tribunal Judicial de Leiria, onde hoje prossegue mais uma sessão do julgamento, referindo sempre ter pensado que “a desgraça fosse maior”.
Classificando a situação como “cenário de um filme”, Sérgio Lourenço precisou o que fez no dia 17 de junho de 2017, quando eclodiram os incêndios, desde que foi para o fogo em Escalos Fundeiros até ao salvamento de pessoas, incluindo um bebé e feridos com queimaduras.
O bombeiro referiu que em Escalos Fundeiros passava “uma linha de média tensão” debaixo da qual “havia árvores e vegetação”, como sobreiros e herbáceas.
Segundo Sérgio Lourenço, o comandante da corporação, Augusto Arnaut, que é um dos 11 arguidos em julgamento, “solicitou mais meios” ao Comando Distrital de Operações de Socorro de Leiria.
Reconhecendo que os meios de combate a incêndios disponíveis eram insuficientes, mas não tinha mais, o adjunto de comando assinalou, por outro lado, que “as comunicações começaram a ser escassas”.
“Tínhamos muitas dificuldades”, assegurou.
Questionado pela procuradora da República Ana Mexia sobre qual o estado da vegetação na Estrada Nacional 236-1, onde foi encontrada a maioria das vítimas mortais destes incêndios, Sérgio Lourenço respondeu que “estava praticamente até à estrada”, mas disse pensar que os ramos das árvores não se tocavam, fazendo o efeito abóbada.
No depoimento, a testemunha adiantou desconhecer que existia outro incêndio – o de Regadas -, esclarecendo não se recordar de ter visto meios aéreos.
“Não me recordo de ter visto nenhum. Não digo que não estivessem lá”, afirmou, acrescentando que “não se via praticamente nada” e a “visão era nula” e que, por isso, quase atropelava uma mulher (que acabou por salvar) “sem dar por ela”.
Sérgio Lourenço explicou ainda como “perdeu o fogo”, quando começaram a surgir as projeções. E à pergunta de um causídico se nunca tinha presenciado isto, respondeu: “Felizmente não”.
Durante a manhã, continuou a prestar depoimento, iniciado na quarta-feira, o comandante dos Bombeiros Voluntários de Peniche, José António Rodrigues.
De acordo com esta testemunha, no espaço de uma hora, entre as 18:30 e as 19:30, houve “uma rotação completa do vento”.
“A velocidade de propagação do incêndio que vimos no local não é compatível a ventos de 25 Kms/hora [o que o AROME, previsão meteorológica para um local, indicava]”, declarou.
José António Rodrigues rejeitou ainda não ser possível Augusto Arnaut ter antecipado o cenário como o que se veio a registar. “Nem ele, nem ninguém”, afiançou.
“A dificuldade em travar este incêndio era notória, o incêndio demorou cinco dias a ser controlado”, assinalou.
Em causa neste julgamento estão crimes de homicídio por negligência e ofensa à integridade física por negligência, alguns dos quais graves. No processo, o Ministério Público contabilizou 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal.
Os arguidos são o comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, então responsável pelas operações de socorro, dois funcionários da antiga EDP Distribuição (atual E-REDES) e três da Ascendi (que tem a subconcessão rodoviária Pinhal Interior), e os ex-presidentes das câmaras de Castanheira de Pera e de Pedrógão Grande, Fernando Lopes e Valdemar Alves, respetivamente.
O presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, Jorge Abreu, também foi acusado, assim como o antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande José Graça e a então responsável pelo Gabinete Florestal deste município, Margarida Gonçalves.
O julgamento prossegue hoje à tarde.