As ideias que se discutem no presente artigo são fruto de um trabalho de investigação que tem sido realizado em Córdoba, Espanha, e devem ser entendidas como preliminares e dinâmicas. As considerações que este artigo propõe foram inicialmente apresentadas no Seminário “Digitalização na Agricultura – Novas Perspectivas”1 que se realizou no passado dia 29 de março de 2022, no Instituto Superior de Agronomia. A sua extrapolação para o contexto português deve ser realizada com precaução e atendendo às diferenças existentes entre ambos países, maioritariamente com respeito à estrutura fundiária das explorações agrícolas e às relações de custos-preços existentes em cada contexto produtivo. Ainda assim, considero que os eventuais pontos de discussão que possam surgir pela leitura deste artigo serão de considerável valor porque os resultados aqui apresentados não são definitivos e a sua posterior publicação no âmbito científico irá certamente beneficiar-se de novas perspectivas.
Resumo das principais ideias
- Existe a percepção de que a adoção de agricultura de precisão (AP) tem ocorrido a um ritmo consideravelmente mais lento do que frequentemente se comunica.
- AP não é uma tecnologia em si, mas integra um conjunto muito variado de conceitos e práticas que se suportam no uso de diversas tecnologias.
- No âmbito deste artigo e para efeitos de síntese, as principais tecnologias que suportam um sistema de AP são denominadas como “tecnologias AP”.
- A utilização de “tecnologias AP” para a obtenção de informação é um processo que tem sido positivamente adotado, mas a integração dessa mesma informação na gestão é pouco frequente.
- A ‘vantagem comparativa’ associada à adoção integrada de “tecnologias AP” não é tão evidente quanto frequentemente se comunica e a sua amortização tende a ser difícil no contexto da nossa agricultura.
- Ainda assim, existem novas oportunidades para promover a adoção de novas “tecnologias AP” devido à actual evolução das relações de preços e ao impacto positivo que a introdução de novos apoios possa gerar.
1. A agricultura de precisão – da tecnologia à gestão.
A agricultura de precisão (AP) integra um conjunto muito diverso de conceitos e práticas que atendem simultaneamente a objetivos de produção e de sustentabilidade ambiental. Não existe portanto uma definição objetiva sobre quais as tecnologias que compõem um sistema de AP. Recentemente, a Universidade de Lérida, em Espanha, publicou um conjunto de 27 definições2 distintas sobre o perfil tecnológico que constitui um sistema de AP. Diversas definições foram apresentadas, muitas concentram-se sobre a monitorização de culturas com recurso a tecnologia de sistemas de informação geográfica (SIG), equipamentos eletrónicos e processos digitais de tratamento de informação, outras centram-se no uso de tecnologia de taxa variável que nos permite ajustar a aplicação de factores de produção (e.g., água, fertilizantes, pesticidas, energia e mão-de-obra) em função das condições produtivas que variam no espaço (e no tempo). Independentemente da definição adoptada, a recolha de informação e a sua análise permitem naturalmente suportar melhores decisões ao nível da gestão, melhorando assim a eficiência no uso de recursos e minimizando riscos indesejáveis3.
No âmbito de AP, a recolha de informação é um processo que pode ser desenvolvido em diferentes escalas e com diferentes resoluções ou níveis de detalhe. Nesse contexto, temos assistido a um progresso notável com respeito ao aparecimento, e ao constante melhoramento, de diversas tecnologias que hoje tão bem conhecemos: SIG, imagens de satélite (ou outras formas de detecção remota), sondas e sensores, software de tratamento de dados e plataformas de acesso à informação. As formas de aplicação destas ferramentas são vastas pois existem inúmeras oportunidades e diferentes níveis de utilização para um universo muito diversificado de sistemas produtivos. […]
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Tomás Roquette Tenreiro
ENG.º AGRÓNOMO, INVESTIGADOR NO CSIC E CONSULTOR INDEPENDENTE INTEGRADO NA EQUIPA AGROGES
1. https://www.youtube.com/watch?v=yiSMh7jpV4I&t=4642s
2. Principais definições de agricultura de precisão de acordo com a literatura científica: http://www.grap.udl.cat/en/presentation/pa_definitions.html (acedido a 15 Mar. 2022).
3. A heterogeneidade espacial é uma realidade nas nossas condições que incorpora riscos tanto para os agricultores como para a sociedade civil. Risco de que se tomem medidas ineficazes, risco de lidar com informação não representativa, risco de sub- ou sobre-utilização de recursos, risco de produção e disponibilidade instável de alimentos, risco de perdas económicas ou de danos ambientais.
O artigo foi publicado originalmente em AGRO.GES.