Porque é que deixamos o milho esquecido nos campos?

“Se as rações estão mais caras, qual o motivo pelo qual vejo imensos campos de milho que não foi apanhado e acabou por secar? Os agricultores não precisam desse milho para alimentar os animais?”

Boa pergunta. Para os agricultores a resposta é óbvia, mas para quem não é agricultor é uma pergunta que faz sentido e à qual tenho todo o gosto em responder, tal como os meus colegas “agro-escritores” norte-americanos já fizeram. 

A resposta é simples: quando o objetivo é conservar o milho através de silagem, a colheita é feita com a planta verde, com cerca de 35% de matéria seca. Toda a planta é cortada / picada e a presença de humidade é importante para uma correta fermentação e conservação da silagem. Se o milho estiver muito seco, acima dos 40% de matéria seca, é mais difícil a compactação para expulsão do ar, a fermentação, a conservação da silagem e a digestão pelos animais. 

Se o objetivo for apenas colher os grãos de milho, para utilizar nas rações para animais, no fabrico de broa de milho ou até para fazer cerveja ( sim, o gritz de milho é utilizado no fabrico da cerveja), nesse caso os agricultores deixam o milho a secar nos campos para colher quando tiver aproximadamente 20% de humidade no grão. 

Tradicionalmente, as espigas de milho eram guardadas nos espigueiros e secas pelo vento que os atravessavam ao longo dos meses e o milho debulhado (retirado da espiga) era seco ao sol na eira. O milho só pode ser armazenado e utilizado nas rações se tiver 14% de humidade (acimda disso pode ganhar bolor), portanto depois de colhido vai ao secador, que funciona a gaz, cujo preço é mais um motivo para deixar o milho secar bem no campo antes de colher. 

Há também um processo intermédio de conservar o milho que é o “Pastone”, que é uma silagem feita apenas com grão ou espiga quase seca.

Mas porque é que se vêem hoje mais campos de milho seco do que há alguns anos atrás? De facto, aqui na minha região, ao longo dos últimos 50 anos, o milho foi quase todo colhido para silagem para alimentar as vacas leiteiras, à medida que a produção de leite se generalizou. Nos últimos anos, muitos agricultores abandonaram a produção de leite mas continuaram a cultivar os campos ou arrendaram a terra a outros agricultores, como é o meu caso. Em parte da terra que aluguei cultivo milho para silagem para alimentar os meus animais, noutros terrenos cultivo milho que deixo secar para grão que vai ser vendido para fazer rações para as várias espécies pecuárias.

O facto do haver falta de milho no mercado mundial, de ter melhor preço atualmente e de haver alguns secadores privados e um grande secador cooperativo agora a funcionar na região explica porque se vêem este ano mais campos de milho “seco” do que se via antigamente. Infelizmente houve ainda algumas situações em que a falta de água não permitiu a produção de milho e não há sequer milho para colher. Espero que sejam situações pontuais, mas sei que houve muitos casos de menor produção e menor qualidade, em que se fez “silagem sem espiga”, para aproveitar o pouco que cresceu.

#carlosnevesagricultor

#milho

#milhogrão

O artigo foi publicado originalmente em Carlos Neves Agricultor.


Publicado

em

,

por

Etiquetas: