Jorge Tomás Henriques, presidente da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA) defende a criação de “stocks mínimos de segurança que permitam salvaguardar a produção e abastecimento dos consumidores” na UE e Portugal.
Pressionados pelo encarecimento das matérias-primas que utilizam para produzir bens alimentares e bebidas, pela factura da energia, pela disrupção logística e até pela falta de viaturas para transportar cereais para as fábricas e de contentores para as exportações, os empresários da indústria agro-alimentar estão cientes de que nem tudo poderá ser repassado para o elo seguinte da cadeia até ao consumidor final. Daí a importância de adequar os apoios ao sector, defende Jorge Tomás Henriques, presidente da FIPA – Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares.
Nos últimos 12 meses de onde tem vindo a maior pressão sobre os custos de produção?
Com a evolução da pandemia, deu-se a nível mundial uma retoma, ao mesmo tempo, que se pressionou, de uma forma muito intensa, toda a cadeia de abastecimento. Estamos a falar das matérias-primas agrícolas que Portugal necessita para a produção industrial – e aí entram à cabeça os cereais milho, trigos, cevada – e óleos, de uma forma geral, que foram muito pressionados, com aumentos brutais, em muitos dos casos acima dos 50%. A par da posição que a China tem assumido, principalmente nestes dois anos de pandemia, que é a constituição de reservas alimentares para a sua população, colocando uma forte pressão sobre os principais mercados exportadores deste tipo de matérias-primas, incluindo as de embalagem (desde os plásticos e papel e cartão ao vidro). Tivemos também um aumento exponencial no custo do gás natural, por exemplo, que subiu, em contratos a partir de Setembro e Outubro do ano passado, praticamente 400%.
A par disto tivemos os aumentos dos custos de transporte, nomeadamente dos transportes marítimos, com aumentos verdadeiramente astronómicos nos contentores em determinadas rotas e simultaneamente a falta de contentores para as exportações da indústria agro-alimentar, porque Portugal faz muitas exportações em contentores de 20 pés – que começaram a escassear, e a ficar parqueados, sobretudo na Ásia.
Tivemos, e ainda estamos a ter, dificuldades nos transportes terrestres, com camiões graneleiros, para levar os cereais dos portos para as fábricas, porque as marcas produtoras deste tipo de veículos começaram a ser pressionadas pela falta de componentes e a entrega de determinado tipo de veículos para estes transportes estavam acima de nove meses.
Toda esta disrupção na cadeia de abastecimento é uma conjugação de factores que designei de tempestade perfeita, porque na realidade tudo se abateu, em simultâneo, sobre uma indústria que estava a crescer nas suas exportações – e fez um ano com 14%. Porque, simultaneamente, o aumento destes custos não foi transferido, com excepções de alguns que são absolutamente incontornáveis, nomeadamente aqueles que não têm marca. Porque todos os produtos assentes numa marca têm muito mais dificuldade na passagem ao mercado destes aumentos.
Até ao final do ano passado, o aumento dos custos foram impactantes para os custos das empresas e não se reflectiram no consumidor final. Houve um grande esforço de ir acomodando estes aumentos até ao limite. E vamos ver que consequências vai trazer, independentemente dos rumores que se ouvem de que há aumentos – e há efectivamente, se se for verificar no mercado final.
Quando diz que as exportações aumentaram 14% é em 2020?
À comparação de 2021 com 2020 [mais 14%, para 5,76 mil milhões de euros]. Mas há uma coisa importante: as indústrias do agro-alimentar e das bebidas têm um crescimento relativamente a 2019. Não houve uma queda em 2020.
E a 24 de Fevereiro, a Ucrânia foi invadida pela Rússia. Em que é que veio alterar a situação de “tempestade perfeita” que já existia?
Tivemos um terramoto em cima da tempestade perfeita. Do ponto de vista económico, a guerra extravasa a Ucrânia, impacta em toda a Europa e no mundo. Porque é que Portugal veio a sofrer ainda mais face à situação que já tínhamos da pandemia? É que nós dependemos da Ucrânia em termos de milho para a produção de alimentos compostos para animais em mais de 40%. Nós importamos da Ucrânia qualquer coisa como 151 milhões de euros – representa praticamente o nosso principal fornecedor [de milho].
Na colza, dependemos em 60% das importações da Ucrânia; da mesma forma que dependemos alguma coisa relativamente à semente de girassol e […]