Quais serão as diferenças na distribuição das espécies florestais na Europa daqui a 13, 43 e 73 anos – em 2035, 2065 e 2095 –, face aos efeitos das alterações climáticas? Esta é uma das principais questões colocadas pelo projeto EU-Trees4F, que apresenta informação importante para o planeamento e gestão da silvicultura, biodiversidade e bioeconomia no continente europeu.
Para antecipar as mudanças nas florestas europeias entre 2022 e 2095, o projeto EU-Trees4F criou um modelo que estima a alteração da distribuição de 67 espécies de árvores em intervalos de 30 anos, numa projeção que contempla dois cenários climáticos: o menos gravoso RCP4.5, que pressupõe o controlo do aumento das emissões de gases com efeito de estufa (GEE) e a respetiva estabilização em meados do presente século, e o mais gravoso RCP8.5, que prevê o crescimento contínuo das emissões de GEE durante todo o século.
O projeto EU-Trees4F é coordenado pelo Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia – cofundado pelo projeto FORGENIUS, que contribui para o repositório da diversidade genética das árvores florestais da Europa – e apesar de não incluir parceiros de I&D portugueses, analisa algumas das espécies mais comuns da floresta portuguesa. Foram considerados por exemplo, o pinheiro-bravo (Pinus pinaster), o pinheiro-manso (Pinus pinea), o castanheiro (Castanea sativa), o medronheiro (Arbutus Unedo) e vários carvalhos nativos do nosso país, como o sobreiro (Quercus suber), a azinheira (Quercus ilex), o carvalho-cerquinho (Quercus faginea), o carvalho-negral (Quercus pyrenaica) e o carrasco (Quercus coccifera).
As projeções têm como base informação da Base de dados EU-Forest, relativa à atual distribuição das espécies a nível europeu (inventários florestais de 21 países) e estes dados são cruzados com outros elementos, nomeadamente com sete parâmetros bioclimáticos do EURO-CORDEX (modelos climáticos regionais) e com dois parâmetros específicos dos solos (matéria orgânica e pH).
A partir destes dados foram desenvolvidos mapas comparativos (exemplos em baixo) que identificam o território potencial de cada espécie seguindo modelos de distribuição conjuntos: o modelo de distribuição e dispersão MigClim (a verde, nos mapas) e a área com potencial de adaptação, mas ainda não ocupada pela espécie (a azul, nos mapas).
A modelação indica diferentes tipos de áreas para os dois cenários de alterações climáticas considerados: as áreas que se tornarão incompatíveis com a presença de determinada espécie, as que se manterão compatíveis e as áreas que ganharão condições propícias a acolher dada espécie.
Além de permitir o aperfeiçoamento das informações sobre a conservação dos recursos genéticos florestais, a informação proporcionada pelo EU-Trees4F dá a conhecer quais as espécies mais adequadas em dada zona e as várias opções territoriais para o seu estabelecimento, incluindo as possibilidades de colonização de novas áreas que, em função da previsão das alterações climáticas, se tornarão compatíveis com a sua sobrevivência.
A colonização destas novas áreas beneficiará a saúde e resiliência das florestas europeias, embora as projeções indiquem que as zonas com potencial para acolher espécies florestais não são suficientes para compensar a perda dos territórios onde se distribuem atualmente: a capacidade das espécies arbóreas europeias de compensar a perda de território dispersando-se (ou seja, colonizando novas áreas) é baixa.
Os dados do projeto EU-Trees4F permitem informar decisões futuras sobre o uso do solo e apoiar a migração assistida das espécies, mapeando locais viáveis de produção, num contexto de diversificação de opções e promoção de ecossistemas florestais resilientes.
Segundo os autores, “estas duas informações são uma ferramenta útil para simular a gestão de cenários relativos ao futuro das florestas europeias”. Em paralelo, salientam, o conhecimento é relevante para várias áreas, desde a silvícola à biodiversidade, serviços de ecossistemas e bioeconomia.
A inclusão de 67 espécies no projeto EU-Trees4F não foi feita ao acaso: além de considerar espécies com peso na economia dos países europeus, houve necessidade de se incluir uma variedade de espécies que contribui para a resiliência aos distúrbios decorrentes das alterações climáticas, trazendo três importantes tópicos para discussão: a conservação, a gestão de serviços de ecossistemas e a bioeconomia. Assim, uma das utilizações importantes deste estudo é a criação de políticas com base em dados científicos fidedignos, especialmente por parte do Pacto Ecológico Europeu e das Estratégias da União Europeia para a Biodiversidade, a Bioeconomia e a Floresta.
Projeções EU-Trees4F para espécies portuguesas
As projeções para as várias espécies presentes no nosso país sugerem que, perante os efeitos das alterações climáticas, parte do território continental, começando pelo sul, ficará gradualmente com condições mais adversas para acolher espécies que dali são hoje características, abrindo-se, em zonas mais a norte e nordeste da Europa, condições mais propícias para as acolher.
Por exemplo, o medronheiro que está hoje presente de norte a sul de Portugal continental, poderá recuar para o Centro e Norte do país, ganhando potenciais territórios em regiões do centro europeu (Inglaterra, por exemplo) onde atualmente não existe.
Alterações semelhantes são avançadas para a distribuição do sobreiro, hoje presente em todo o país, e que, segundo as projeções, poderá recuar ao Centro e Norte ou só para o Norte.
Outras espécies florestais e agroflorestais poderão reduzir a sua distribuição ou até deixar de existir em solo lusitano no final do século, em qualquer dos dois cenários climáticos apresentados. São exemplo desta projeção o pinheiro-bravo, o pinheiro-manso e o carvalho-cerquinho.
O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.