A proposta de orçamento para a União Europeia tem recebido algumas críticas, nomeadamente do primeiro-ministro português. A Comissão Europeia diz-se, ainda assim, “esperançada” em alcançar um acordo.
O primeiro-ministro, António Costa, reafirmou esta segunda-feira, em Lisboa, a sua oposição à proposta de orçamento para a União Europeia por “não corresponder às necessidades” da Europa, nem conter um financiamento “adequado e justo” para Portugal.
“O presidente do Conselho [Europeu] apresentou uma proposta que não é boa, não corresponde às necessidades da Europa”, afirmou António Costa à entrada de uma reunião extraordinária da Comissão Permanente de Concertação Social, defendendo que a proposta de orçamento “não corresponde aquilo que é a necessidade de preservar a política de coesão”.
O primeiro-ministro defendeu ainda que a proposta não possibilita a Portugal “prosseguir uma trajetória de recuperação” da sua economia, “onde os fundos comunitários têm um papel absolutamente essencial”, e reafirmou que a posição do Governo “é negativa” quanto a essa proposta.
“Presumo que com os parceiros sociais encontraremos uma sintonia de posições com o Governo, como agora temos tido nesta matéria, porque nesta matéria estamos todos juntos na defesa daquilo que é o interesse nacional”, acrescentou.
Em declarações aos jornalistas, António Costa lembrou que existem várias propostas para o orçamento da União Europeia, e explicou que o executivo se tem “concentrado menos na discussão do volume global, mas mais naquilo que é necessário para que a Europa tenho um orçamento ao nível das suas ambições”.
O primeiro-ministro disse ainda que, “entre a proposta da Comissão e a do Parlamento Europeu é onde o Conselho devia procurar encontrar um consenso”.
“Parece-me errado o presidente do Conselho, em vez de procurar uma aproximação entre as posições da Comissão e a do Parlamento Europeu, esteja aparentemente obcecado em procurar ir ao encontro de alguns Estados membros, que são uma minoria no Conselho, não têm respaldo no Parlamento Europeu”, comentou. “Acho que estamos a ir no caminho errado”, acrescentou.
O primeiro-ministro disse ainda que, no momento em que a União Europeia “ainda agora se dividiu com a saída Reino Unido, seria um péssimo sinal que enfraquecesse a sua coesão”, ao reduzir verbas para esse efeito.
António Costa falou ainda do objetivo de manter um nível de financiamento adequado e justo” e lembrou que Portugal “é o único país” que sofreu um “programa de ajustamento muito duro” e que, neste momento, sofre “uma perda significativa” de receitas da União Europeia, nas propostas apresentadas.
Na sexta-feira, em Bruxelas, o presidente do Parlamento Europeu, David Sassoli, ameaçou um chumbo da assembleia europeia, que tem a palavra final, à nova proposta do Conselho para o orçamento plurianual da União Europeia (UE), recusando negociar “a qualquer custo”.
“A proposta em cima da mesa hoje não é uma base satisfatória para alcançar um orçamento que responda aos compromissos assumidos no início do novo mandato, pelo que exorto os chefes de Estado e de Governo a envidarem todos os esforços para melhorá-la, no âmbito da cimeira de 20 de fevereiro, porque, caso contrário, o Parlamento não poderá aceitá-la”, avisou David Sassoli em comunicado.
Comissão Europeia “esperançada” em acordo esta semana
A Comissão Europeia afirmou-se esta segunda-feira “esperançada” num compromisso a 27 sobre o orçamento da União Europeia para 2021-2027 na cimeira extraordinária desta semana em Bruxelas, considerando que a nova proposta é “um bom ponto de partida”.
Na conferência de imprensa diária do executivo comunitário, a Comissão Europeia, através do seu porta-voz, considerou que a proposta colocada sobre a mesa pelo presidente do Conselho Europeu constitui “um bom ponto de partida”.
Eric Mamer sustentou que a proposta “está acima da proposta finlandesa”, rejeitada pelos líderes da UE no Conselho Europeu de dezembro passado, e, entre aspetos que segundo a Comissão são positivos, destacou que a mesma “prevê claramente ‘dinheiro fresco’ para o Fundo da Transição Justa” e contempla que 25% do montante global seja destinado a atividades ligadas ao Pacto Ecológico, a ‘bandeira’ da ‘Comissão Von der Leyen’.
“Claramente, cabe ao presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, fazer avançar estas negociações. É obvio que estas negociações são sempre muito complexas. A presidente [da Comissão, Ursula von der Leyen] disse na semana passada em Estrasburgo que não há tempo a perder, e por isso estamos obviamente esperançados num resultado positivo na cimeira”, declarou.
A proposta divulgada na última sexta-feira pelo Conselho, e que constitui o ponto de partida para as negociações durante a cimeira extraordinária de chefes de Estado e de Governo da União Europeia, é bastante semelhante à que foi apresentada pela presidência finlandesa do Conselho da UE no segundo semestre de 2019, e continua a prever cortes na Política de Coesão e na Política Agrícola Comum, rejeitados por Portugal, entre muitos outros Estados-membros.
O documento contempla um envelope global de 1.094 mil milhões de euros, representando estas contribuições o equivalente a 1,074% do Rendimento Nacional Bruto (RNB) do conjunto da União, muito próximo do valor proposto no ano passado por Helsínquia (1,07% do RNB), e que Portugal considerou na altura “inaceitável”.
Esta nova base negocial proposta por Charles Michel, depois de semanas de consultas aos 27, destina 323 mil milhões de euros aos fundos da política de coesão (contra 367,7 mil milhões do atual quadro financeiro 2014-2020, já sem contar com os contributos do Reino Unido) e 329,3 mil milhões de euros para a Política Agrícola Comum (contra 367,7 mil milhões do orçamento plurianual ainda em curso).
Um grupo alargado de Estados-membros, denominados os “Amigos da Coesão”, com Portugal à cabeça, têm reafirmado a sua firme oposição a cortes sobretudo nesta política, assim como na PAC.
A proposta de Charles Michel continua a ser inferior à que foi apresentada originalmente pela Comissão Europeia (que contemplava contribuições de 1,114% do RNB), e muito aquém do valor de 1,3% do RNB defendido pelo Parlamento Europeu, que tem a última palavra no processo negocial, e que já manifestou o seu descontentamento com o novo documento sobre a mesa, apontando precisamente que não difere muito da proposta finlandesa, claramente rejeitada pela assembleia.