O PSD considerou hoje que o banco de terras que o PS quer criar “trará mais complexidade legislativa e maior desordenamento”, enquanto os socialistas defenderam que “é a ultima peça para fechar o ‘puzzle’ da reforma florestal”.
O projeto do PS para a criação de um banco de terras e de um fundo de mobilização de solos sem dono conhecido foi aprovado na generalidade na Assembleia da República, com o apoio do Bloco de Esquerda e do Livre.
PCP e Iniciativa Liberal votaram contra o diploma proveniente da bancada socialista, enquanto PSD, Chega e PAN optaram pela abstenção.
No debate parlamentar que antecedeu a votação deste projeto-lei para a criação de um banco de terras e para a dinamização de um fundo de mobilização destes solos, a deputada social-democrata Emília Cerqueira teceu críticas à proposta, considerando-a uma “má solução”.
“Este projeto-lei que o PS aqui nos traz é claramente mais uma iniciativa à boa moda socialista. Embrulhado nos chavões e promessas bonitas, mas que olhado com atenção é mais uma má solução e um engano para os graves problemas do nosso território”, afirmou.
No entendimento dos sociais-democratas, o projeto socialista vai introduzir “mais desafios ao território, mais complexidade legislativa e um maior desordenamento do território”.
“É a velha teoria do PS. Faz-se uma lei após outra, complica-se cada vez mais, para não fazer nada, pois o projeto do PS ignora o quadro vigente atual. Ignora a existência de uma bolsa de terras e a própria lei de 2019 que aprovou o procedimento do reconhecimento das terras sem dono, para a sua execução do cadastro”, apontou.
A deputada social-democrata considerou ainda que a criação do banco de terras vai levar a que se descore o processo do cadastro.
“Com a aprovação do banco de terras como está proposto como ficará o cadastro? Uma vez que os terrenos sem dono conhecidos voltam a integrar o banco de terras”, questionou.
Em defesa da proposta, a deputada socialista Berta Nunes afirmou que este projeto-lei “será a última peça para fechar o ‘puzzle’ da reforma florestal” e um “forte instrumento de combate ao despovoamento”.
“A criação de banco de terras é a última peça para fechar o ‘puzzle’ da reforma florestal iniciada pelos governos socialistas. Tem sido o PS a fazer as reformas que o país precisa. As reformas do PS são para melhorar a vida das pessoas”, afirmou a deputada.
Relativamente às considerações sobre o cadastro, Berta Nunes assegurou que este projeto-lei irá resolver a implementação deste mecanismo e lembrou que tanto no Alentejo como no Algarve o cadastro “já está praticamente completo”.
“Vejam a grande quantidade de território e municípios que já estão cadastrados. Se olharmos para esse mapa ele está principalmente a sul, no Alentejo e no Algarve, porque existe muito mais dificuldade em fazer esse cadastro com os métodos tradicionais a norte, com a pequena propriedade”, argumentou.
Das outras bancadas parlamentares também se ouviram algumas críticas ao projeto-lei socialista, nomeadamente do Bloco de Esquerda, que também apresentou um diploma sobre a criação de um banco público de terras agrícolas.
“O nosso [projeto-lei] parte da mesma análise do PS, mas salvaguarda mais os interesses dos pequenos proprietários e a sustentabilidade ambiental”, afirmou Pedro Filipe Soares.
Durante a sua intervenção, o presidente do grupo parlamentar do BE defendeu ainda a importância do cadastro, ressalvando, contudo, que este não deve servir apenas para pedir responsabilidades aos proprietários, mas também para que o Estado “possa agir e intervir”.
Já o PCP, através do deputado João Dias, acusou o PS de querer “fazer um confisco” às pequenas propriedades com a criação de um banco de terras.
“Quer primeiro que tudo intervir na dimensão da propriedade, concentrando-a, e depois quando a propriedade já estiver nas mãos dos grandes é que vai aumentar o preço da madeira”, acusou.
Por seu turno, o deputado do Chega Pedro Pinto questionou a eficácia deste projeto e acusou os socialistas de quererem fazer expropriações.
“Se o próprio Estado nem consegue cuidar das suas terras, como podemos confiar que com este fundo que o PS vem criar, fazer expropriações, as coisas serão diferentes?”, observou.
Já a intervenção da Iniciativa Liberal, a cargo de Rui Rocha, foi feita com recurso ao humor, utilizando o último nome do primeiro-ministro.
“Vou recorrer a dois conceitos. O primeiro conceito é a costice e o segundo é o de costaclismo. A costice é o modo de funcionamento normal do primeiro-ministro, António Costa, e do seu Governo. As costaclices são as consequências das costices. Portanto, temos uma sucessão de costices que, mais cedo ou mais tarde, vão ter uma consequência, que é um costaclismo”, brincou.
Por sua vez, o PAN, que também apresentou um projeto-lei para aprovar um programa nacional de deseucaliptização, defendeu a necessidade de mudar a forma como se olha para a floresta, pegando no exemplo dos incêndios deste verão.
“O que temos de retirar destes incêndios é que é mais do que tempo mudarmos as políticas em matéria florestal e ambiental, abandonando as soluções que só veem o eucalipto como o alfa e o ómega da floresta. Temos de mudar o mosaico florestal”, defendeu Inês de Sousa Real.
Já o deputado único do Livre, Rui Tavares, considerou interessante a existência de um banco de terras, desde que se consiga encontrar “bons destinatários”.
“Existir um banco de terras, desde que na especialidade possamos averiguar acerca dos usos deles, possamos encontrar bons destinatários, como por exemplo cooperativas, para que possam utilizar temporariamente esses terrenos, parece-me que responde a uma necessidade do país, como várias leis ao longo do século já tiveram de responder”, defendeu.
Na mesma série de votações, baixou a comissão sem votação um projeto do PAN que pretende aprovar um Programa Nacional de Deseucaliptização, assim como uma resolução desta mesma força política para a “renaturalização e interdição da caça” no Parque Natural da Serra da Estrela.
O projeto do PS agora aprovado na generalidade retoma uma iniciativa do Governo socialista de 2017 integrada na reforma da floresta, mas que foi chumbada nessa legislatura em que a bancada socialista era a segunda maior, após o PSD, na Assembleia da República.