Queria fazer “algo importante”: idoso recebe herança milionária e usa-a para reconstruir a igreja da aldeia

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O caso de Raymond Landy tem gerado ampla curiosidade em França depois de o agricultor idoso, hoje com 92 anos, ter decidido usar a herança milionária deixada pelo irmão para reconstruir a igreja da sua aldeia natal, La Chapelle-sur-Aveyron, no departamento de Loiret, a sul de Paris. A história foi contada pela televisão pública France 3 e detalhada por órgãos de comunicação como o jornal espanhol ABC, que relatam o espanto das autoridades locais, habituadas a lidar com fortes limitações financeiras na preservação do edifício histórico.

A história ganhou destaque pela forma como um homem que viveu quase toda a vida no anonimato decidiu canalizar uma quantia tão elevada para um projeto comunitário. Segundo essas publicações, a aldeia é pequena e a igreja representa o principal símbolo do território, funcionando como ponto de referência cultural e social para várias gerações.

Uma vida simples e um vínculo profundo ao lugar

Raymond cresceu no mesmo pedaço de terra onde sempre trabalhou e viveu com o irmão. Ambos dedicaram a vida à agricultura e permaneceram na mesma casa durante décadas, sem que nenhum tivesse constituído família. De acordo com a imprensa francesa e espanhola, eram conhecidos pela discrição e pela forma como participavam na vida local sem procurarem protagonismo.

O francês explicou que nasceu, foi batizado e fez a comunhão naquela igreja. Para si, o edifício representa uma parte essencial da memória coletiva da aldeia. Ao longo dos anos, o templo entrou num estado acentuado de deterioração, com problemas na estrutura e risco de queda de elementos interiores, situação que o município não tinha capacidade financeira para resolver devido ao orçamento reduzido e à limitação de subsídios públicos.

A herança que desbloqueou décadas de impasse

A morte do irmão, em 2022, alterou de forma inesperada o destino daquele património. Raymond recebeu mais de um milhão de euros em herança e, segundo o ABC, decidiu usar esse dinheiro “para fazer algo importante”: doar mais de um milhão de euros à comuna para financiar a reabilitação da igreja. No total, a doação ascende a cerca de 1,38 milhões de euros, repartidos em várias fases, montante que permite cobrir praticamente a totalidade do custo das obras.

A autarquia já tentara, durante anos, obter fundos para iniciar os trabalhos, mas os custos estimados estavam muito além do orçamento municipal anual. A doação de Raymond permitiu finalmente avançar com um plano de restauro completo, que inclui a recuperação da estrutura, intervenções na cobertura e na nave e a preservação dos elementos históricos mais frágeis.

As escolhas feitas por Raymond têm paralelo em Portugal no que diz respeito ao enquadramento legal das heranças e doações. À luz do Código Civil português, os herdeiros podem, em regra, dispor livremente dos bens recebidos por sucessão, desde que respeitem os direitos dos herdeiros legitimários, como o cônjuge, descendentes e ascendentes, definidos no artigo 2157.º e seguintes.

No caso das doações, o artigo 940.º estabelece que qualquer pessoa com capacidade jurídica pode doar parte ou a totalidade dos seus bens, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, desde que não prejudique a legítima dos familiares protegidos por lei e sejam cumpridas as formalidades legais aplicáveis. Tal como aconteceu em França, também em Portugal um herdeiro pode, dentro destes limites, destinar uma herança a projetos comunitários ou obras de interesse público, incluindo a reabilitação de património religioso.

A aldeia ganhou um novo fôlego

Com o financiamento assegurado, as obras de restauro foram finalmente lançadas. Habitantes e autarcas descrevem o gesto como um raro ato de gratidão para com a terra que acolheu a família durante toda a vida. Para muitos residentes, a renovação da igreja não só preserva o principal símbolo da aldeia, como poderá contribuir para manter viva a comunidade e atrair mais gente às celebrações e atividades locais.

O impacto de um gesto que não procurou reconhecimento

Raymond Landy permanece discreto e não demonstra interesse em protagonismo. Segundo a imprensa espanhola, limitou-se a dizer que queria fazer “algo importante” pela sua gente e que o dinheiro deveria servir um propósito maior do que ele próprio. A placa colocada na fachada da igreja regista o contributo dos dois irmãos, mas o benemérito continua a viver numa casa de repouso, acompanhado à distância da evolução das obras.

A reconstrução da igreja está a decorrer por fases: depois do arranque dos trabalhos no campanário, seguir-se-ão intervenções no coro, na cobertura e na estrutura da nave, com as principais obras previstas ao longo dos próximos meses. Para a pequena aldeia francesa, o projeto marca um novo capítulo na história de um património que, durante anos, se degradou sem solução à vista e que agora ganha uma nova oportunidade graças à decisão de um único habitante.

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