Relações entre fornecedores e distribuidores: Conquistar a atenção, evitar a precipitação – Pedro Pimentel

A Ministra da Agricultura e do Ambiente, Assunção Cristas, em duas recentes ocasiões – declarações a quando da visita à Agrival e entrevista publicada na edição de 26 de Agosto do Expresso – colocou o problema das dificuldades de relacionamento entre fornecedores e distribuidores como uma das principais prioridades políticas da sua actuação.

Assim, depois de em Penafiel haver referido que quer apostar na “promoção de um debate entre produtores, indústria e distribuidores para melhorar os mecanismos de articulação entre as diferentes áreas da agricultura”, na entrevista ao Expresso aprofunda esta matéria afirmando que é “preciso conseguir gerar diálogo com a distribuição, que resolva alguns nós que existem e que o Governo anterior já tentou desatar”.

Acrescenta ainda que “em breve teremos uma reunião com a distribuição e depois juntaremos todos à mesma mesa para ver se conseguem autorregular-se, criar códigos de conduta, ultrapassar diferendos”.

No entanto e aparentemente percebendo as dificuldades inerentes a todo este processo e ao desequilíbrio de forças entre aquelas partes, afirma também que “em princípio as pessoas terão capacidade de diálogo, mas se não tiverem nós trataremos de ajudar a resolver. Será uma acção concertada com o Ministério da Economia. Naturalmente que o Governo tem poder legislativo e regulamentar para, no limite, encontrar os caminhos que pareçam mais adequados”.

A questão – fundamental – da coordenação com o Ministério da Economia (que, como se sabe, tutela o sector do comércio), surge também manifesta na entrevista dada por um dos Secretário de Estado daquele ministério – Carlos Oliveira, responsável pela pasta do Empreendedorismo, Competitividade e Inovação – que, igualmente ao semanário Expresso, afirma: “na agricultura queremos ter uma maior produção de produtos nacionais e ajudar a que eles sejam escoados para os mercados. Em algumas áreas há apenas pequenas falhas na cadeia de valor e é preciso evitar que isso aconteça. Estamos a trabalhar nesse sentido em articulação com o Ministério da Agricultura. Mas temos reunido também com a grande distribuição para perceber como se pode aumentar a componente de produtos portugueses”.

As dificuldades de relacionamento com a grande distribuição constituem, actualmente, um dos mais complexos, senão mesmo o estrangulamento com maior impacto no sector agro-alimentar nacional e vimo-lo afirmando desde há anos.

Contudo e ressalvando que a experiência nos diz que entre as declarações públicas e as intenções políticas e aquilo que a prática exige – a nível legislativo, mas também e de forma igualmente importante, a nível da fiscalização e acompanhamento – existe, geralmente, uma enorme distância, não deixa de ser relevante esta linha de raciocínio (e, esperamos, a consequente linha de actuação) a qual coincide, em larga medida, com aquilo que vimos de há muito defendendo:

Instituição de plataformas de diálogo entre produção, indústria e distribuição;

Promoção de uma regulação das relações entre a distribuidores e fornecedores;

Esgotando-se a capacidade de implementação de esquemas de auto-regulação, imposição de esquemas de regulação, com a criação de uma estrutura com os necessários poderes para penalizar, na justa medida e em tempo útil, os comportamentos inadequados dos diferentes operadores;

Promoção da articulação entre os Ministérios da Agricultura e da Economia;

De fora, em nossa opinião, continua a fundamental matéria do acompanhamento e fiscalização, que como repetidamente afirmamos, deverá funcionar como elemento dissuasor de más práticas e de comportamentos juridicamente e eticamente penalizáveis e ser realizada de forma sistemática e regular e não apenas como resposta às (justificadamente) inexistentes denúncias.

Tal como de fora continua também a resolução da indefinição actual sobre quem – AdC? ASAE? – e com que meios realiza esse acompanhamento e fiscalização.

O relatório da Autoridade da Concorrência de Outubro de 2010, apesar das sua limitações e de ser excessivamente inconclusivo, deixa terreno para perspectivar as tarefas seguintes e, todos sabemos, o caminho apenas se faz caminhando.

É muito importante que a intenção da nova Ministra se traduza em acções concretas e este, em boa verdade, é um dossier que, sem adiamentos nem cedências, pode gerar inúmeros benefícios para o sector agro-alimentar, com custos praticamente nulos para o erário público.

Contudo, a complexidade do dossier é demasiada para que se possa compadecer com precipitações, com acções desestruturadas, com calendários politicamente orientados ou com a aprovação de medidas avulsas e descontextualizadas, de significativa visibilidade mediática, mas de nulo impacto prático.

Definitivamente, esta não é uma prova de velocidade, mas sim uma corrida de resistência, que o sector agro-alimentar não pode deixar de participar e, mais do que isso, não pode deixar de tentar, a todo o custo, vencer.

Pedro Pimentel
Presidente da Direcção da Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios (ANIL)

Das palavras aos actos – Pedro Pimentel


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