Um especialista espanhol em gestão da água admite que a seca e as alterações climáticas são preocupantes, mas defende que a questão mais importante é o aumento da procura de água, principalmente para a agricultura e o turismo.
“A seca e as alterações climáticas estão a agravar o problema, mas a questão mais importante é o desequilíbrio, agravado nos últimos anos, entre a oferta e a procura crescente de água”, disse Gonzalo Delacámara, assessor internacional em políticas da água, em Madrid, em declarações à agência Lusa.
O especialista em gestão económica dos recursos naturais que presta serviços para a Comissão Europeia, Nações Unidas e Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) defende que se “devia dar mais atenção ao longo prazo”, sendo o “problema fundamental” a procura crescente de água na Península Ibérica, que é agravada nos anos de seca ou de menor pluviosidade.
Gonzalo Delacámara responsabiliza principalmente o setor agrícola, o principal consumidor de água em Espanha que é responsável por cerca de 70% da sua utilização.
As necessidades de rega no sul do país leva a que desde os anos 60 haja uma política de transvazes que levou à construção de infraestruturas de várias centenas de quilómetros para desviar, por exemplo, parte da água do rio Tejo para o Guadiana e o Segura.
Por outro lado, a prolongada falta de chuva que afeta atualmente grande parte da Espanha está a ameaçar o setor agrícola, com os pedidos de indemnização por seca nos últimos anos, com danos significativos causados por este fenómeno, a atingirem os 210 milhões de euros para os segurados.
Esse número foi registado em 2012, e cinco anos mais tarde, em 2017, houve outro episódio de seca que envolveu uma compensação de 143 milhões de euros, segundo a seguradora agrária Agroseguro.
Outro setor que consome muita água é o turístico, sendo Espanha um dos principais destinos mundiais, com mais de 75 milhões de visitantes por ano, o que também provoca uma grande procura de água, nomeadamente na sua costa mediterrânica, de maio a setembro.
Gonzalo Delacámara afirmou que “a pressão gerada não é tanto de colocar em causa a água para a população”, mas que a situação pode evoluir nos próximos anos.
“O desafio é global e devíamos delinear um plano europeu” para fazer a gestão da água, porque os tratados bilaterais, como o de Albufeira, entre Espanha e Portugal, apenas conseguem resolver alguns problemas.
A Convenção de Albufeira, assinada em 1998, substituiu vários instrumentos anteriores, reforçando a cooperação harmonizada entre os dois Estados ibéricos para a gestão de bacias partilhadas.
Os dois países estiveram reunidos há uma semana e decidiram que vão passar a acompanhar mensalmente os caudais dos rios partilhados, nomeadamente os rios Minho, Lima, Douro, Tejo e Guadiana.
A articulação dos processos de planeamento hidrológico e a análise das possibilidades de ação face ao risco de seca foram as duas principais questões abordadas.
As reservas de água nos reservatórios hidrográficos de Espanha caíram esta semana para 44% da sua capacidade total, ficando a um nível de cerca de 29% da média verificada em 2021 e também nos últimos 10 anos na mesma semana.
De acordo com os dados divulgados esta semana pelo Ministério da Transição Ecológica espanhol, de todas as bacias hidrográfica, a situação mais preocupante está nas do Guadiana (30% da capacidade total), Guadalete-Barbate (30%) e Guadalquivir (29%).
As bacias com maior quantidade de água armazenada são as do País Basco (95%), as do Cantábrico Oriental (82%) e as de Tinto, Odiel e Piedras (74%).
A situação das reservas nas bacias hidrográficas contíguas a Portugal, em rios que na maior parte dos casos desaguam neste país, variam desde 53% na do Minho-Sil, 50% na do Douro, 45% na do Tejo e até 30% na do Guadiana.