Seguro de Colheitas no Olival – Rita Braz Frade

O presente artigo visa deixar alerta para as incoerências existentes nos seguros de colheitas que existem para o olival em Portugal, que advêm da legislação existente e que põem em causa a sua utilidade.

Os seguros que existem para o olival cobrem, quase na generalidade alguns tipos de sinistros tais como incêndio, acção de queda de raio, granizo, geada, queda de neve, tornado, chuva persistente e tromba de água, sendo que fica coberto é a quantidade produzida de azeitona, isto é perda de kgs face aos kgs segurados.

Por outro lado, o prejuízo mínimo indemnizável é de 30,01% e é apurado pelo conjunto de sinistros ocorridos durante a duração da apólice em determinada parcela.

Relativamente à duração da apólice, todas as coberturas têm início no 8º dia após a data de contratação, que é sempre posterior a 1 de Março e são válidas até à colheita ou, se esta for posterior a 1 de Março, tem validade até: 31 de Janeiro para olivais compostos exclusivamente por uma ou mais das seguintes variedades ‘Cobrançosa’, ‘Picual’, ‘Verdial’, ‘Cordovil’ ou ‘Carrasqueira’, ou 31 de Dezembro para olivais que incluam qualquer outra variedade.

Já o risco é coberto quando o evento ocorra a partir da verificação do fruto formado, quando pelo menos 50% das árvores tenham atingido a fase do ciclo vegetativo equivalente ao endurecimento do caroço, isto é, quando o fruto evidencie o calibre próprio da variedade em causa.

Ora, daqui surgem logo três incoerências, que convém estar atento e conhecer:

1ª incoerência – para além do prejuízo mínimo indemnizável ser de 30,01%, que é bastante elevado, estes 30,01% funcionam como uma “fasquia” até à qual não há sinistro, mas a partir da qual o sinistro é considerado na totalidade, ou seja, ou oito ou oitenta, não havendo um meio termo;

2ª incoerência – o risco apenas é coberto quando o fruto já está formado e pelo menos 50% das árvores já se encontrem em fase de endurecimento do caroço. Ora, isto acontece a partir de Junho/Julho (dependendo da variedade, região geográfica e condições climáticas de cada ano) e dura maioritariamente até Outubro/Novembro. No entanto, entre Junho e Outubro, a probabilidade de ocorrência de queda de raio, geadas, queda de neve, chuva persistente ou tromba de água é muito baixa ou quase inexistente, quando comparada com os períodos temporais em que não existe ainda fruto, mas já existem gemas ou flor e que cujos danos os seguros não cobrem;

3ª incoerência: a duração da apólice vai de 8 de Março até no máximo 31 de Dezembro ou Janeiro, dependendo da variedade em questão. E a verdade é que durante os meses de Janeiro e Fevereiro (pico do Inverno) é frequente existirem ocorrências de granizo, geada ou neve, não estando assim os olivais seguros nestes meses que podem ser críticos. Esta incoerência é de tal forma agravada se considerarmos que o frio e a geada causam a maioria das vezes danos irreversíveis no olival, como queimaduras, desfoliação, ou congelamento, com prejuízos graves na produção seguinte.

Em suma, os riscos que se encontram cobertos nas apólices actualmente existentes mostram-se incompatíveis com a respectiva duração proposta. Mais, os meses de Janeiro, Fevereiro e parte de Março (que são os mais frios e por vezes bastante chuvosos) não se encontram contemplados no período de duração das apólices. E por fim, o frio e a geada (que provocam danos muito graves no olival, ainda mesmo sem fruto, e que comprometem a campanha seguinte) também não estão contemplados.  Uma oliveira queimada, congelada e desfolhada perde uma parte importante da sua massa vegetativa produtiva e na Primavera seguinte em vez de se dedicar à formação de frutos vai investir toda a sua “energia” na reposição dos ramos e das folhas que perdeu, comprometendo a colheita vindoura.

Dando exemplos prácticos da minha própria experiência como gestora de um olival de que sou responsável no Alto Alentejo, em 2016/2017, mais de um terço desse olival foi totalmente arrasado pelas geadas de Fevereiro (fotografias abaixo). Em virtude disso, foi activado o seguro de colheita contratado, mas, dadas as restrições acima mencionadas,  não houve lugar à devida indemnização. Contudo, esta zona foi, tal como era previsível, totalmente improdutiva nessa campanha, o que significou um prejuízo elevado, quer pela falta de produção, quer pela própria recuperação dessa área. Neste caso concreto, a geada aconteceu em Fevereiro, previamente à floração e endurecimento do caroço, justamente no período em que a apólice não tem cobertura. A oliveira tem um ciclo anual e não é só a queda de fruto ou até mesmo de flor que compromete a produção, tal como se poder constatar da situação relatada.

É por tudo isto que considero que os seguros existentes são inadequados face à realidade existente, cobrindo apenas uma parte do estado vegetativo da planta e apresentando restrições e duração incoerentes para o olival em Portugal, sendo premente rever a presente situação, adequando estes seguros a nossa realidade, sob pena de perderem a sua utilidade.

 

Rita Braz Frade

Owner, Dazeite – olive oil brokerage

Gestão Agrícola, Herdades do Melo e da Rosada

 

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