Serras do Socorro e Archeira: uma aposta na conservação e valorização

Erguem-se na paisagem de Torres Vedras duas serras irmãs, com histórias antigas de resistência e invasões, mas também com histórias recentes de conservação e valorização. A constituição da Paisagem Protegida Local das Serras do Socorro e Archeira (PPLSSA), que assinalou o seu 10.º aniversário em 2022, é delas testemunha.

Como em tantos outros locais, o território do concelho de Torres Vedras foi objeto de várias transformações ao longo do tempo, muitas vezes desregradas.

Nas Serras do Socorro e Archeira (e áreas envolventes), muitas destas alterações acabaram por traduzir-se no abandono das terras, com uma crescente degradação e desvalorização do seu valor patrimonial, em termos naturais, históricos, culturais e paisagísticos.

Com o intuito de inverter o processo, a Câmara Municipal de Torres Vedras quis classificar o território que engloba as Serras do Socorro e Archeira como área protegida de âmbito local, com base no regime jurídico da Conservação da Natureza e Biodiversidade e nos pressupostos da Convenção Europeia da Paisagem.

Da intenção à prática decorreram vários anos:

  • a ideia e proposta inicial datam de 2004,
  • a constituição formal decorreu em 2012,
  • e a integração na Rede Nacional de Áreas Protegidas em 2017.

“O grande objetivo passou, e continua a passar, por criar condições que garantam a proteção do património das Serras do Socorro e Archeira, a nível biofísico, estético, paisagístico, cultural e ecológico”, conta a presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras, Laura Rodrigues, ao Florestas.pt, acrescentando que “este trabalho de conservação e valorização tem de ser feito, necessariamente, de forma equilibrada, permitindo o desenvolvimento sustentável da região”.

Assim, aos objetivos de proteção, intrinsecamente ligados à promoção do ordenamento do território das Serras do Socorro e Archeira, juntam-se outros, como a promoção e divulgação de todas as suas potencialidades enquanto polos de atração turística e de lazer.

“Todo este trabalho em torno da Paisagem Protegida Local das Serras do Socorro e Archeira procura envolver as comunidades, também através da dinamização de atividades educativas e científicas. Só assim podemos promover a defesa do património natural, ambiental e cultural dos cerca deste 1192 hectares”, afirma Laura Rodrigues, Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras.

Natureza e história para descobrir nas Serras do Socorro e Archeira

A constituição do Centro Interpretativo da Paisagem Protegida Local das Serras do Socorro e Archeira tem contribuído para a atração e dinamização local. Situado na Cadriceira, na freguesia do Turcifal, este é um espaço de planeamento e apoio à gestão da Paisagem Protegida Local, mas não só: tem patentes exposições (A História e o Património da Serra do Socorro, por exemplo) e uma loja onde se promovem produtos locais, desde vinhos e licores a artesanato, passando por doces regionais, biscoitos e compotas.

É ainda deste Centro que partem muitas das atividades turísticas promovidas e, nesta área de dinamização, a responsável destaca a oferta diferenciada de serviços e produtos relacionados com as chamadas “Linhas de Torres”, um sistema defensivo construído para proteger Lisboa durante as invasões napoleónicas, cuja primeira linha se estendia desde Alhandra, nas margens do Tejo, passando por Torres Vedras, até ao Oceano Atlântico, numa extensão de 46 quilómetros.

“Existe toda uma memória e identidade local associada a estes valores histórico-culturais e três obras militares encontram-se na paisagem protegida: o Forte da Archeira, o Reduto da Feiteira e o Reduto de Catefica”, refere. Hoje, este capítulo da história pode ser revisitado através do trilho circular Grande Rota das Linhas de Torres (GR30), tanto ciclável como pedestre, que se prolonga por sete concelhos e por 112 quilómetros.

Se é verdade que o património relacionado com este histórico sistema defensivo é uma das principais motivações de quem visita Torres Vedras, é também verdade que as Serras do Socorro e Archeira apelam igualmente ao turismo de natureza, com um conjunto variado de rotas, trilhos e atividades que permitem aos visitantes entrar em contacto com a diversidade de fauna e flora, e desfrutar do ar livre.

Trilhos, como o da Rota dos Encantos, fundem natureza e património histórico, a pista de downhill (descida de bicicleta, em velocidade, que começa no topo da Serra do Socorro e termina no sopé) desafia os mais aventureiros, do baloiço no miradouro panorâmico admira-se a vastidão da paisagem e os dois observatórios de aves instalados na mesma serra convidam a descobrir os valores naturais da Paisagem Protegida.

Entre as aves que podem ser observadas contam-se, entre outras, o peneireiro-vulgar (Falco tinnunculus), o galeirão-comum (Fulica atra) e a cotovia dos bosques (Lullula arborea), enquanto nos caminhos pelas serras não é inédito avistar texugos, genetas ou até raposas. Na flora, entre as muitas espécies presentes, merecem referências, pela sua beleza, as orquídeas e a rosa-albardeira (Paeonia broteri).

“A valorização socioeconómica da Paisagem Protegida Local das Serras do Socorro e Archeira deve respeitar, impreterivelmente, o seu património natural e cultural. Por esse motivo criámos o Observatório da Paisagem, uma estrutura de apoio que monitoriza os impactos dos diversos sectores de atividade”, refere a responsável, explicando que todas as atividades e estruturas implementadas, incluindo as turísticas, são alvo de acompanhamento e avaliação.

Proteção e resiliência das zonas naturais e florestais

Num concelho onde a ocupação do solo é predominantemente rural (87,6 % da sua área), as zonas agrícolas (que ocupam mais 51% da área rural) e florestais (quase 49%) intercalam cercais e matagais, assim como várias faixas de vegetação ribeirinha que acompanham os cursos de água.

Também elas fazem parte desta Paisagem Protegida Local, pelo que a sua gestão sustentável é outro dos eixos orientadores do trabalho que tem vindo a ser desenvolvido, e no qual se integra a prevenção e resiliência aos incêndios rurais.

A The Navigator Company, que gere eucaliptais na Paisagem Protegida, é parceira nesta proteção e resiliência. A empresa, que já tinha em vigor, com os municípios de Torres Vedras e Mafra, um Plano de Fogo Controlado (desde 2008), passou a integrar o Conselho Consultivo da Paisagem Protegida Local desde que esta foi constituída e é parceira do Município de Torres Vedras na gestão da área protegida desde 2021.

“Durante o período crítico, está localizada na Serra do Socorro uma equipa da AFOCELCA – agrupamento complementar de empresas do grupo The Navigator Company e do grupo ALTRI – para efetuar a vigilância e a primeira intervenção e, por outro lado, desempenhar um papel dissuasor e de sensibilização”, explica a Presidente da Câmara.

Recorde-se que a Serra da Archeira e, principalmente, a Serra do Socorro têm zonas de floresta plantada para produção de madeira, uma forma de combater o abandono e de dinamizar uma parte destas terras. As plantações de eucalipto presentes têm registado das maiores produtividades a nível nacional e são consideradas uma montra do que se deve fazer em termos de gestão florestal sustentável, pelo que estas áreas têm sido também motivo de várias ações de sensibilização, de promoção e demonstração de boas práticas florestais.

Em paralelo, a Câmara Municipal tem vindo ainda a investir diretamente na proteção, sensibilização e resiliência do seu território contra os incêndios, nomeadamente através da Comissão Municipal de Defesa da Floresta e do Gabinete Técnico Florestal: em 2007, foi definido o primeiro Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios e, em 2019, foi criada uma equipa municipal de Sapadores Florestais, reforçada em 2021 com a constituição de um segundo efetivo.

Neste trabalho, o Gabinete Técnico Florestal assume um papel essencial, inclusive na vertente de sensibilização junto da comunidade, um trabalho muito relevante já que no concelho existem habitações próximas de áreas florestadas, o que faz com que cada um tenha um papel insubstituível no que respeita à defesa da floresta.

De resto, no concelho de Torres Vedras existem inúmeras empresas a laborar exclusivamente no sector florestal, algumas com relevo a nível nacional, que atuam nas múltiplas atividades silvícolas, incluindo preparação do terreno, plantação, gradagem, limpeza de matos, adubação, corte e rechega de madeira, e aproveitamento dos sobrantes para biomassa. “Este sector tem um importante peso na economia e no emprego local, existindo inúmeras famílias que dele dependem”, reitera Laura Rodrigues.Aos objetivos específicos de conservação e dinamização da Paisagem Protegida Local das Serras do Socorro e da Archeira juntam-se outros, mais amplos, que procuram criar condições para a fixação dos jovens e suas famílias e para a captação de investimento no Concelho. Também eles, refere a Presidente da Câmara, são norteados pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável definidos pela Organização das Nações Unidas.

O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.


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