Setor florestal mantém atividade e diz ser “estratégico” para a retoma

O setor florestal português registou “algum abrandamento” nas atividades de gestão e industriais devido à pandemia, mas as cadeias logísticas e de abastecimento mantiveram-se asseguradas e a fileira garante ser “estratégica” para a recuperação económica do país.

“Os trabalhos de prestação de serviços e atividades de gestão florestal, na sua generalidade, correram numa situação de quase normalidade. Houve necessidade de nos adaptarmos à nova legislação e as indústrias da fileira foram afetadas de diferentes formas e intensidades, mas não houve notícias tão bombásticas como noutros setores“, afirmou o presidente da direção do Centro Pinus, João Gonçalves, num ‘webinar‘ (seminário ‘online’) organizado hoje pela consultora Agroges sob o tema “As florestas e a crise que vivemos: um olhar para além da pandemia“.

Também Luís Veiga Martins, diretor-geral da Celpa — Associação da Indústria Papeleira, disse terem sido mantidas durante este período “as atividades mais ou menos normais de gestão florestal”: “Naturalmente com alguns ajustamentos dos planos de exploração, mas tentou-se que as atividades continuassem com o mínimo de distorção”, sustentou.

Já o presidente da direção da Filcork – Associação Interprofissional da Fileira da Cortiça, João Rui Ferreira, admitiu “algum abrandamento das atividades de gestão” florestal, em linha com o registado no resto da Europa, mas assegurou que “nestes dois meses houve a grande preocupação de manter todas as cadeias logísticas e de abastecimento em funcionamento”.

No que se refere à área industrial, o impacto das restrições impostas para evitar a disseminação do surto de covid-19 foram mais sentidas em alguns setores, como o da serração e dos aglomerados de pinho, enquanto noutros a situação foi até geradora de negócio acrescido.

“Na serração houve uma redução com algum significado devido à paragem da construção. Na área da trituração para mobiliário, em que o Ikea é grande consumidor na Europa e fechou as lojas todas, os aglomerados e painéis viram as encomendas reduzidas e alguns dos nossos associados tiveram que entrar em ‘lay-off’, com pelo menos 40% da atividade afetada, o que é um impacto grande”, afirmou o diretor do Centro Pinus.

Pelo contrário, acrescentou, em áreas industriais como a resina e a embalagem, a crise sanitária abriu até algumas oportunidades: “Os nossos associados de resina não imaginaram que aguarrás disparasse tanto de preço, porque é muito usada em produtos de limpeza, e na indústria de embalagem e de paletes houve um aumento de procura, sobretudo no início da crise, porque as famílias quiseram repor ‘stocks’ e as embalagens de madeira e cartão foram muito requisitadas”, notou.

Na fileira do sobro, onde o mercado vitivinícola assume particular importância para as vendas de rolhas de cortiça, o diretor da Filcork destacou a importância, do ponto de vista industrial, de “manter todas as cadeias de abastecimento aberto”.

“Como a indústria vinícola foi considerada prioritária em todos os países que são os nossos principais destinos de exportação, a indústria vinícola manteve a atividade, nomeadamente nas adegas, e nós tivemos a responsabilidade de manter o abastecimento dos nossos clientes”, disse João Rui Ferreira.

Recordando a “muita preocupação sentida nas primeiras duas semanas [da crise sanitária] com a introdução de planos de contingência, para que não houvesse propagação do vírus dentro das empresas”, o responsável considera que “o impacto económico [da pandemia] ainda não foi sentido” na fileira, que registou “até março um nível de exportações muito estável” e manteve uma atividade industrial “muito regular, apenas com casos muito pontuais de curtos encerramentos”.

“Evidentemente que o impacto no turismo e restauração vai refletir-se no consumo de vinho, mas temos que tornar este desafio uma oportunidade”, sustentou o diretor da Filcork, salientando a ainda “muita incerteza” existente, nomeadamente em torno de “quanto é que o retalho vai conseguir substituir o consumo que se fazia no [canal] Horeca [hotelaria, restauração e cafetaria], tanto em volume como em valor”.

De acordo com João Rui Ferreira, a atual “grande preocupação” da fileira é “garantir que a campanha de extração da cortiça — que arranca em meados de maio e prossegue até agosto – decorre com normalidade”, de forma a assegurar um ano 2021 de bons resultados para o setor, em que Portugal é líder mundial.

“Qualquer disrupção que haja na fileira poderia impactar a atividade económica do próximo ano e pôr-nos em competição com produtos alternativos, portanto é muito importante que tudo corra o mais próximo possível da normalidade”, sustentou.

Já para o diretor-geral da Celpa, representativa da fileira do eucalipto, as preocupações passam pela “sustentabilidade dos fornecedores ao longo da cadeia de valor” e por uma eventual “segunda vaga da doença durante a época dos fogos rurais”: “A base [do setor] é frágil, é um tecido económico de PME [pequenas e médias empresas] que, caso encerrem, será difícil antecipar a sua renovação”, admitiu.

Para Luís Veiga Martins, “o que esta crise veio demonstrar é que é necessário que os países tenham capacidade de autoabastecimento e de, através dos agentes económicos locais, terem indústrias fortes que possam puxar pela economia do país”, sendo sua convicção que “o setor florestal vai ter um peso enorme no relançamento económico do país”.

Uma opinião partilhada pela Filcork, cujo presidente da direção acredita que “muito do que é fundamental fazer nas fileiras [da floresta] já o era no pré-covid” e que as redobradas preocupações ambiental e com a sustentabilidade decorrentes da crise abrem ao setor “uma oportunidade única para ocupar o território de outros produtos” menos amigos do ambiente.

A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 251 mil mortos e infetou quase 3,6 milhões de pessoas em 195 países e territórios.

Mais de um 1,1 milhões de doentes foram considerados curados.

Em Portugal, morreram 1.074 pessoas das 25.702 confirmadas como infetadas, e há 1.743 casos recuperados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.

Para combater a pandemia, os governos mandaram para casa 4,5 mil milhões de pessoas (mais de metade da população do planeta), encerraram o comércio não essencial e reduziram drasticamente o tráfego aéreo, paralisando setores inteiros da economia mundial.

Face a uma diminuição de novos doentes em cuidados intensivos e de contágios, alguns países começaram a desenvolver planos de redução do confinamento e em alguns casos a aliviar diversas medidas.

 

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