As incertezas em torno do acordo de exportação de cereais da Ucrânia já elevaram o preço de alguns produtos, alertou hoje a ONU, pedindo a extensão da iniciativa para preservar os seus efeitos benéficos para a economia.
“Num ambiente de incerteza comercial, os sinais importam muito”, disse Rebeca Grynspan, secretária-geral da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD, na sigla em inglês).
“Quando não há clareza, ninguém sabe o que vai acontecer, e a especulação e a acumulação assumem o controlo”, insistiu Rebeca Grynspan, num comunicado à imprensa que acompanha um relatório da sua equipa fornecendo uma atualização sobre a Iniciativa do Cereais do Mar Negro.
As negociações estão em andamento com a Rússia, que se queixa de lhe terem sido “prometidas coisas que não estão a ser cumpridas” nos acordos assinados por Moscovo e Kiev em 22 de julho sob a égide da ONU e da Turquia.
Em pouco tempo, o acordo “ganhou força”, com a “atividade portuária ucraniana a aumentar e grandes cargas de cereais a conseguirem chegar aos mercados mundiais”, segundo indicou a UNCTAD num relatório com uma avaliação inicial desta iniciativa, que levou à estabilização, e posterior baixa, dos preços dos produtos.
“No entanto, com o acordo a terminar dentro de um mês e face à incerteza que paira sobre a sua renovação, os preços de certas matérias-primas como o trigo e o milho voltam a subir”, observou a UNCTAD, sobretudo porque sem esta iniciativa, “há poucas esperanças de garantir a segurança alimentar, particularmente nos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos”.
A primeira parte do acordo permite, por um período de 120 dias, a exportação de cereais ucranianos bloqueados desde o início da invasão russa da Ucrânia, em 24 de fevereiro. A segunda parte visa facilitar a exportação de alimentos e fertilizantes russos, apesar das sanções impostas pelos países ocidentais à Rússia.
Durante as discussões com a ONU, “sublinhamos as nossas preocupações com a implementação da parte russa do acordo, porque ainda estamos a enfrentar problemas com a logística essencial (…). Os nossos navios não estão a ser recebidos nos portos europeus por causa das sanções”, disse hoje o Gennady Gatilov, embaixador russo junto da ONU em Genebra, numa conferência de imprensa.
A intenção da ONU é renovar o acordo por um ano.
“A prorrogação (deste) acordo depende da garantia da plena implementação dos dois acordos anteriormente celebrados”, disse o embaixador, considerando que as negociações avançaram pouco.
A UNCTAD destaca que durante o curto período de implementação da iniciativa, “as exportações de cereais para países em desenvolvimento e menos desenvolvidos começaram a recuperar”.
“Mas ainda há um longo caminho a percorrer para igualar os níveis de exportação anteriores”, reconhece.
Por exemplo, quase um milhão de toneladas de milho e trigo foram enviadas da Ucrânia para países em desenvolvimento. No entanto, as exportações entre janeiro e setembro de 2022 ainda estão abaixo dos níveis de exportação do mesmo período de 2021.
A diferença entre esses dois períodos é considerável: em 2021, atingiu 2,4 milhões de toneladas para o milho e 8,1 milhões de toneladas para o trigo.
A ofensiva militar lançada a 24 de fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou já a fuga de mais de 13 milhões de pessoas – mais de seis milhões de deslocados internos e mais de 7,7 milhões para países europeus -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
A invasão russa – justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia – foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e imposição à Rússia de sanções políticas e económicas.
A ONU apresentou como confirmados desde o início da guerra 6.306 civis mortos e 9.602 feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais.