A consultora Oxford Economics Africa considerou hoje que o impacto da guerra entre a Rússia e a Ucrânia beneficia Moçambique pelo aumento do preço das matérias-primas, mas arrisca um aumento dos custos com os alimentos.
“O forte aumento dos preços de certas matérias-primas no seguimento da invasão da Ucrânia pela Rússia vai aumentar as receitas das exportações de Moçambique, mas o elevado preço dos alimentos num país já de si afetado pela pobreza extrema e pela insegurança alimentar aumenta o risco de manifestações por causa dos alimentos e a reintrodução de subsídios mais abrangentes”, dizem os analistas.
Numa nota enviada à Lusa sobre o impacto da guerra em Moçambique, os analista desta consultora escrevem que apesar de Moçambique não ter comércio significativo com nenhuma das forças em confronto, “quase 18% dos fertilizantes, 15% do trigo e 11% do óleo alimentar vêm destes países”, alertam.
“Apesar de a exposição de Moçambique às importações destes países ser relativamente baixa, em comparação com outros países africanos como Egito ou Marrocos, os preços globais destas matérias-primas, juntamente com os preços de outros produtos agrícolas como o combustível ou a farinha, subiram exponencialmente devido ao conflito”, apontam os analistas.
A subida destes preços vai fazer com que a inflação em Moçambique se mantenha elevada, com a Oxford Economics Africa a antecipar um valor próximo de 10% até ao terceiro trimestre deste ano, “o que terá um enorme impacto na inflação global, já que os preços alimentares e das bebidas não alcoólicas valem quase 34% do cabaz de preços”.
Isto, aliás, leva os analistas a aumentarem a previsão da inflação em Moçambique para quase 9% este ano, face aos 7,3% anteriormente previstos.
No que diz respeito às exportações, apesar de as vendas à Rússia serem diminutas, “os preços das principais exportações, nomeadamente o carvão mineral, o alumínio refinado e o titânio, para além do petróleo, subiram muito nas últimas semanas, e representam 60% dos bens exportados a nível global em 2021, que já estavam a subir antes mesmo do conflito”.
A consequência, concluem, é que o valor das exportações em dólares das matérias-primas moçambicanas deverá subir 40% para 9,2 mil milhões de dólares, em comparação com a previsão dos analistas no princípio do ano.
Deixando as finanças públicas de lado e olhando apenas para a situação interna, a Oxford Economics Africa aponta que o panorama não é positivo: “O aumento das exportações e das receitas governamentais devido aos preços mais altos das matérias-primas levaram-nos a aumentar a estimativa de crescimento do PIB de 3,2% para 2,4%, mas temos de sublinhar que um PIB maior não é necessariamente igual a mais riqueza nas famílias”, avisam.
“Os consumidores moçambicanos são muito dependentes de subsídios alimentares e vão, por isso, ficar pior com preços alimentares mais elevados”, afirmam, lembrando que em 2010 houve manifestações mortais e grandes protestos contra o aumento dos preços dos alimentos, quando o Governo decidiu acabar com os subsídios aos alimentos.
“Com a inflação alimentar a dever chegar a um nível similar ao de 2010 e as forças governamentais já esticadas para combaterem os rebeldes extremistas islâmicos no norte, aumentou o risco de os protestos contra a crescente inflação, se isso acontecer, o Governo pode ser pressionado a usar as receitas das matérias-primas para voltar a aplicar subsídios aos alimentos e combustíveis”, concluem.
A Rússia lançou em 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que matou pelo menos 1.179 civis, incluindo 104 crianças, e feriu 1.860, entre os quais 134 crianças, segundo os mais recentes dados da ONU, que alerta para a probabilidade de o número real de vítimas civis ser muito maior.
A guerra provocou a fuga de mais de 10 milhões de pessoas, incluindo mais de 3,9 milhões de refugiados em países vizinhos e quase 6,5 milhões de deslocados internos.
A ONU estima que cerca de 13 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.
A invasão russa foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e o reforço de sanções económicas e políticas a Moscovo.