Uma semi-desculpa de Montenegro e apoios pós-fogos

O que é possível agora é tentar evitar, em primeiro lugar, que estes incêndios de grandes dimensões continuem a repetir-se — e, nesse sentido, Montenegro foi buscar um plano que tinha apresentado em março (estava o anterior Governo em gestão) e que quer agora pôr em prática. A ideia é tornar-se um “pacto de regime” para reordenar as florestas e valorizá-las, embora até agora não tenha sido discutida com os partidos.

Assim, o que está em causa é o Plano Floresta 2050, que foi nessa altura apresentado pelo Executivo como “um ambicioso instrumento estratégico que visa transformar a gestão da propriedade florestal, fortalecer a resiliência contra incêndios, promover boas práticas no setor”. Implicaria, segundo essa primeira apresentação, um investimento de 6.500 milhões de euros para tornar a floresta sustentável e resiliente e “apoiar a transição para um futuro mais verde e sustentável”.

“O Plano Floresta 2050 reconhece que os territórios rurais que representam 14% da população portuguesa, cerca de 1,5 milhões de pessoas enfrentam graves desafios, incluindo a presença de 3,5 milhões de prédios rústicos em heranças indivisas, que representam três vezes a população residente, e são diretamente impactados por fenómenos como as alterações climáticas, a expansão das espécies invasoras e os incêndios rurais”, explicava então o Executivo. O plano prometia um conjunto de 19 medidas e 154 ações estratégicas para concretizar estes objetivos.

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“O futuro da nossa floresta depende do contributo e da articulação, da confluência, da convergência e da coordenação entre vários setores da sociedade. Este pacto para a floresta é feito entre ordenamento do território, agricultura, ambiente, educação, com contributos da academia e virado para a inovação”,  defendia então Luís Montenegro.

Esta quinta-feira, Montenegro explicou que o plano ficou aprovado em Conselho de Ministros e que será remetido à Assembleia da República “para a realização de um debate sobre o seu conteúdo, com vista a consensualizar um verdadeiro pacto para a gestão florestal”, e à Comissão Europeia, na sequência que tinha tido horas antes com Ursula Von der Leyen para integrar muitas destas medidas no financiamento da Comissão, previsto para os países que promoverem medidas de prevenção dos fogos.

Neste ponto, não foram detalhadas mais medidas relativas ao plano: essas serão, disse Montenegro, apresentadas com detalhe pelo ministro da Agricultura e do Mar, José Manuel Fernandes, e discutidas no Parlamento de forma mais aprofundada. O plano é do Governo, mas Montenegro deixou votos de que possa ser “interpretado por todos como um pacto”, com uma “convergência” para que se diminua “de forma muito significativa a ocorrência de incêndios e a dimensão dos que não podemos evitar”. Resta saber se os outros partidos concordam.

A segunda frente de ataque foram as medidas para o pós-fogos, de forma a apoiar os afetados pelos incêndios. Ainda sem o conjunto total de medidas — Montenegro referiu que serão 45 no total, mas ainda não foi fornecida aos jornalistas uma lista completa–foi possível perceber que algumas são novas e que os apoios habituais em anos de grandes incêndios tiveram valores atualizados.

Estas medidas farão parte de um regime mais amplo que será o quadro a adotar quando se colocarem circunstâncias semelhantes às destas semanas. Ou seja, em vez de todos os anos serem aprovados novos apoios, “este instrumento será a base a partir da qual os governos poderão de forma rápida, ágil, colocar no terreno instrumentos e medidas de apoio à recuperação das zonas e pessoas afetadas”, argumentou — e será também a base que justificará que não haja “necessidade nenhuma” de declarar agora o estado de calamidade, ao contrário do que aconteceu no ano passado, argumentou.

Esse instrumento poderá ser acionado por “simples resolução do Conselho de Ministros” e terá uma delimitação temporal e geográfica de acordo com uma proposta da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil e do ICNF, explicou o primeiro-ministro.

E destacou algumas das medidas em causa: a primeira foi o reforço dos cuidados de saúde nas zonas afetadas, prevendo-se a isenção de taxas moderadoras e medicamentos gratuitos; logo veio a ex-ministra da Saúde, Marta Temido, dizer ter “estremecido” ao ouvir o anúncio, lembrando que as taxas moderadoras acabaram quando estava no Governo, em 2022 (na verdade, ainda existem mas apenas para quem for às urgências sem ser referenciado previamente). A medida já tinha sido implementada no ano passado.

Quanto a quem teve casas de primeira habitação afetadas pelos fogos, o Executivo aumentou o financiamento disponível: será comparticipada a 100% a reconstrução até 250 mil euros e 85% no resto do valor para primeiras habitações, sendo que no ano passado a comparticipação a 100% só existia até aos 150 mil euros; prevê-se também um concurso para que as autarquias locais possam candidatar-se com vista a rápida recuperação de infraestruturas públicas afetadas. O papel central na definição desses apoios será das autarquias e CCDR, explicou Montenegro.

Preveem-se também apoios às famílias para as suas despesas de sustentabilidade, quando ficar comprovada a sua “carência económica”; apoios para bens de alimentação animal, além de uma isenção de IVA na doação desses alimentos; apoios à tesouraria das empresas afetadas e para a capacidade produtiva; apoios financeiros para potencial produtivo agrícola e um apoio excecional para agricultores com prejuízos, até 10 mil euros, para despesas não documentadas; a isenção de contribuições para a Segurança Social em empresas ou trabalhadores afetados pelos incêndios na sua atividade; um apoio extraordinário às empresas que mantenham postos de trabalho; e um alargamento de prazos para contribuições fiscais.

Montenegro acrescentou ainda que o Conselho de Ministros também aprovou medidas excecionais de contratação pública para as empreitadas e fornecimentos necessárias para a recuperação, como já tinha feito no passado. Agora, o Governo está em contacto permanente com a Comissão Europeia para que todos os apoios possam ter um enquadramento de financiamento europeu, dentro dos regulamentos que existem.

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