Ricardo Braga e Gonçalo Rodrigues

Vamos continuar a precisar de mais estações meteorológicas? – Gonçalo Caleia Rodrigues e Ricardo Braga

A sustentabilidade da agricultura mediterrânica depende, cada vez mais, de uma eficiente gestão dos recursos disponíveis. De todos, o que mais carece de uma adaptação evolutiva é o uso da água nos sistemas de produção. A evidência das alterações climáticas e a conjugação de dois fenómenos – a redução da precipitação e o aumento da temperatura –, expõe o Mediterrâneo, e, em especial, Portugal a regimes de escassez recorrentes com impacto evidente no ciclo vegetativo e na produtividade das culturas.

A melhoria do rendimento agrícola deverá passar por um melhor conhecimento das culturas, do solo e, principalmente, do clima. A agrometeorologia é considerada um dos fatores mais relevantes para uma informada tomada de decisão em agricultura. Contudo, a monitorização agrometeorológica continua a ser insuficiente; a insuficiência de pontos de observação, a (por vezes questionável) qualidade, a indisponibilidade de forma gratuita são alguns dos obstáculos que impedem uma gestão de rega realmente ajustada às necessidades hídricas das culturas.

Contudo, dado os atuais avanços tecnológicos, será que continuaremos a necessitar de mais Estações Meteorológicas Automáticas (EMAs)? Será que não há alternativa às (dispendiosas em custo de aquisição e manutenção) EMAs?

Existem hoje diversas plataformas onde podem ser recolhidos dados meteorológicos que derivam do uso de simulações de modelos numéricos de previsão do tempo com base num conjunto de observações meteorológicas; são exemplo as plataformas a Climate Forecast System Reanalysis (CFSR), a European Centre for Medium-Range Weather Forecasts (ECMWF), a National Center for Environmental Prediction/National Center for Atmospheric Research (NCEP/NCAR), e a NASA Prediction of Worldwide Energy Resource (NASA POWER). Mas serão estes dados fiáveis ?

Num estudo recente que publicámos1 (que pode ser consultado aqui: https://www.mdpi.com/2073-4395/11/6/1207),  tentou-se avaliar o potencial do uso de dados fornecidos pela NASA através da sua plataforma Prediction Of Worldwide Energy Resources como uma alternativa fácil, fiável e sem custos às observações das EMAs. A plataforma disponibiliza dados diários de temperatura, humidade relativa, precipitação, radiação solar e velocidade e direção do vento para uma malha de 0,5° x 0,5° no mundo inteiro. A facilidade de uso do NASA POWER reside na sua simplicidade, uma vez que podemos consultar os dados para um único ponto ou para uma região por atacado. A sua interface simples permite que qualquer utilizador (mais ou menos experiente) tenha acesso fácil e gratuito a dados meteorológicos em tempo real para qualquer parte do mundo tirar.

Breve vídeo explicativo de consulta da plataforma.

Exemplo da plataforma. Temperatura máxima diária em Coruche (01/01/2020 a 24/06/2021)

No referido estudo, os resultados demonstraram que o NASA POWER é capaz de estimar, com erros marginais, os dados de temperatura máxima e mínima, e radiação solar para a região do Alentejo. Apesar de ainda haver espaço para melhoria, os dados da velocidade do vento e de humidade relativa mostram-se também fiáveis. Com um esforço adicional, que permita corrigir os dados estimados pelas NASA, o erro das temperaturas máxima e mínima e da radiação solar não vão além dos 0,5%; mesmo para o vento e a humidade relativa, os erros de estimativa são inferiores a 3%. Contudo, os dados de precipitação carecem de melhoria; verifica-se alguma discrepância entre as observações terrestres e os dados NASA. Estamos a dedicar estudos a estas potenciais melhorias.

Tais resultados permitem concluir que plataformas como a NASA POWER podem ser úteis para acesso a dados meteorológicos para locais onde não existam estações meteorológicas terrestres, adensando a informação disponível para uma melhor e mais eficiente tomada de decisão, nomeadamente de rega.

Temperatura máxima diária em Beja (01/01/2019 a 31/12/2019): dados observados vs. dados NASA POWER

Se tentarmos estabelecer uma relação benefício/custo entre ter acesso a uma plataforma gratuita, ainda que com um erro marginal de estimativa, e o esforço humano e financeiro de instalar e manter uma estação meteorológica, parece-nos que na maioria dos casos, o benefício se sobrepõe ao custo.

Referência Bibliográfica

1Rodrigues, G.C.; Braga, R.P. Evaluation of NASA POWER Reanalysis Products to Estimate Daily Weather Variables in a Hot Summer Mediterranean Climate. Agronomy 2021, 11, 1207.

Gonçalo Caleia Rodrigues, Professor Auxiliar do Instituto Superior de Agronomia

Ricardo Braga, Professor Auxiliar do Instituto Superior de Agronomia

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