O dilema subsiste: aumentar o número de reservatórios para reter a água que é cada vez mais escassa ou aumentar as áreas de regadio, fundamentando esta opção com a sofisticação tecnológica que diz garantir maior eficiência na gestão dos recursos hídricos.
O país já interiorizou que nesta altura do ano os alertas tocam o vermelho, seja quanto aos incêndios, seja nas disponibilidades hídricas. Tornaram-se recorrentes as situações de emergência, de risco extremo, com fenómenos meteorológicos invulgares de intensidade excepcional e com situações de perigo muito elevado para as populações.
A água desempenha, neste contexto, uma função vital, multiplicando-se os apelos de mais reservatórios para reter os recursos hídricos que escasseiam quando as amplitudes térmicas roçam os 45 graus e o calor é sufocante, sobretudo nas zonas rurais.
Nos debates esgrimem-se argumentos que apelam à construção de mais barragens e o actual Governo correspondeu com um projecto de grande envergadura: “Regadio 2030 – Levantamento do Potencial de Desenvolvimento do Regadio de Iniciativa Pública no Horizonte de Uma Década”. Uma das principais linhas orientadoras do documento prevê a instalação, até 2030, de 134.000 hectares de novos regadios e a modernização de 72.000 hectares de alguns blocos de rega instalados há mais de 50 anos, a maioria no Alentejo.
A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) divulgou, no final de 2021, o Relatório do Estado do Ambiente 2020/21 com um diagnóstico preocupante sobre os recursos hídricos em Portugal, onde revela que ao longo dos últimos anos houve uma redução na disponibilidade de água deixando o país em “stress hídrico”, com maior incidência no sul do país.
Colocado perante este cenário crítico, o Governo prevê investir 588 milhões de euros na modernização dos regadios existentes e 199 milhões na construção de novas infra-estruturas de rega. Destes montantes, a região alentejana irá beneficiar de 304 milhões. Para o centro do país serão canalizados 212 milhões. O nível de investimento, a longo prazo, aproxima-se dos 2000 milhões de euros.
As áreas regadas, públicas e privadas, actualmente instaladas em Portugal cobrem uma superfície agrícola com 626.820 hectares. Cerca de 40% (240.000 hectares) são ocupados por sistemas de iniciativa pública, e destes cerca de 70.000 hectares encontram-se “em avançado estado de degradação e obsoletos’’.
Falta saber se há recursos hídricos suficientes para suprir as necessidades de rega que representam cerca de 80% de toda a água consumida anualmente em Portugal, quando ela já escasseia em Espanha de onde são debitados para o nosso país cerca de 70% dos caudais que abastecem a rede hidrográfica nacional.
Quadro de escassez
O Boletim sobre disponibilidades hídricas armazenadas em albufeiras relativo ao dia 11 de Julho de 2022, editado pelo Serviço Nacional de Informação sobre Recursos Hídricos (SNIRH), apresenta um quadro de escassez que se degrada semana após semana. Verifica-se a diminuição do volume armazenado nas 14 bacias hidrográficas nacionais.
Das 58 albufeiras monitorizadas, sete estão no vermelho (Alto Lindoso, Alto Rabagão, Paradela, Vilar/Tabuaço, Campilhas, Monte da Rocha e Bravura), 25 têm a sua reserva de água abaixo dos 50%, seis estão prestes a atingir este patamar e apenas seis albufeiras tem a sua cota acima dos 80%.
Antecipando-se ao cenário que actualmente se observa, Pimenta Machado vice-presidente da Agência Portuguesa do Ambiente, alertava no dia 3 de Junho em Beja, durante o debate sobre “Perdas de Água: a insustentável realidade” para a realidade na bacia hidrográfica do Guadiana em território espanhol: “A precipitação atmosférica em Espanha é muito reduzida e falta água nas albufeiras.” Esta situação “pode assumir dimensões preocupantes em Portugal já no próximo Verão, pois cerca de 70% da água que o país consome vem de Espanha através dos rios internacionais. E os caudais estão a reduzir”. Reagindo ao apelo constante de mais barragens, o vice-presidente da APA, pediu ponderação “quando temos albufeiras que estão a ficar vazias”. […]